"Passemos ao caso da Educação. Ao sector
que parece congregar maior aversão, e não apenas no que se refere a tudo
o que cheire a professor e apesar dos desmentidos, neste Governo e no
anterior, incluindo nos mais directos conselheiros e decisores na área,
só assim se explicando o desejo de contrair praticamente para metade o
orçamento para o Ensino Não Superior em 2-3 anos e achar-se que isso é
muito bom, pois durante um período de tempo curtíssimo gastámos acima da média.
Comecemos pelos secretários de
Estado, sendo de merecida justiça que ignoremos a da Ciência e o do
Ensino Superior porque não há provas de existam fora do organigrama do
governo. O que até poderia ser bom, se significasse uma
governação consensual, discreta, eficaz, nos seus sectores. ora, pelo
que se nota, nada disso se passa e os reitores e investigadores parecem
tratar directamente dos seus assuntos com o ministro, sendo a única área
em que Nuno Crato parece genuinamente interessado em evitar problemas e
conflitos. Talvez por se sentir inter-pares.
Sobre o SE Casanova de Almeida
também é justo que nos detenhamos pouco tempo pois não é do conhecimento
público qualquer ideia sua sobre Educação, antes ou depois de ter
assumido o cargo. Dizem-me que é óptimo no trato e que consegue
amenizar situações de tensão e gerar consensos em torno de soluções
vazias de conteúdo ou meramente más, como foi o caso do Estatuto do
Aluno. Poderia googlar qualquer coisa em busca de contra-prova
mas julgo que seria perder, inutilmente, alguns segundos da minha vida,
que em termos cósmicos tem uma duração infinitamente pequena e não deve
desperdiçar-se em actos sem sentido.
Sobre o actual SE Gracho,
que substitui a escolha mais caricata desde a ex-ministra Maria do
Carmo Seabra na área da Educação, sempre tive uma opinião favorável por
ser alguém com ideias e posições que, mesmo que discordemos delas,
tinham alguma densidade e coerência. Só que parece que ficarão em estado
de banho-maria neste seu exercício nas lides políticas, pois
tudo aquilo em que se envolveu desdiz o que antes dissera ou faz disso
tábua rasa. E das duas, uma: ou estava mal informado nas suas posições ou decidiu suprimi-las em troca de uma duvidosa honraria transitória.
Sabe-se que anda em negociações com a FNE sobre o próximo ano lectivo
mas como a dita FNE vai negociar mas não informa ninguém do que lá se
passa, não se sabe se apenas é uma encenação destinada a validar as
políticas que o ministério das Finanças mandou implementar no sector.
Quanto ao ministro Nuno Crato,
sou insuspeito na minha desilusão, pois considerei-o a melhor escolha
possível para MEC. Porque, pela sua idade e percurso, considerava-o a
única figura na área política da coligação no poder, capaz de travar a
investida que vinha de trás e se sabia fazer parte do programa eleitoral
explícito e implícito do PSD e do CDS para a Educação. Porque
concordava com algumas das suas posições (por exemplo, sobre a
necessidade de avaliação) e com a sua desafeição com o discurso
dissimulado de muitos responsáveis políticos e especialistas educacionais.
Daí o meu enorme desânimo perante a forma
como, sucessivamente, se mostrou incapaz de controlar a máquina
administrativa do ministério, a despojou de operacionalidade ao optar
por uma estratégia de concentração e esvaziamento de meios técnicos de
apoio às escolas, se rendeu à continuação de muitas das políticas que
criticara aos governos de José Sócrates e, por fim, quase pareceu
implodir, desaparecer do radar político, limitando-se a intervenções
desastradas e típicas daquilo a que Sokal e Bricmont (autores que ele
citou com prazer nas suas análises pré.ministeriais) designaram como “imposturas intelectuais”
por se resumirem, em grande parte, a truques de linguagem e a
utilizações truncadas e manipulatórias dos dados disponíveis como se
fossem argumentos rigorosos e fundamentados.
Poderia recordar a entrevista ao Sol,
na qual recuperou para a sua aritmética os formandos das NO para alegar
que os alunos tinham diminuído 14% e justificar o número de
professores, ocultando que o número de professores diminuiu mais e que a
reorganização curricular foi a primeira razão para a redução dos
horários disponíveis.
Ou a sua promessa de fazer uma vinculação extraordinária de professores contratados que se traduziu numa farsa.
Ou ainda a declaração de que o MEC não
faria despedimentos de professores, sabendo-se que isso não é
juridicamente possível, excepto em casos limite e que a redução de
docentes tem sido galopante na base de outras modalidades como o empurrão para a aposentação ou a não renovação de contratos, isto não falando na questão da mobilidade. Só no último ano deixaram de dar aulas 15475 docentes. Claro que não houve despedimentos
e, no sentido restrito da linguagem, Nuno Crato não faltou à verdade.
Mas ele sabe o que diria se fosse ele a analisar alguém que tivesse
feito em 2008 ou 2009 o que ele fez em 2012.
E chegamos a 2013 e à garantia de que a carga horária dos professores não aumentará.
Ora, sabe-se agora que o aumento do horário para a FP não passará para
as 40 horas, depois de meses a martelarem as redacções dos jornais com
essa confidência que agora se qualifica como especulação. Assim
como se sabe que dentro da carga horária dos docentes existem duas
componentes, lectiva e não lectiva, que podem ser manipuladas de forma a
colocar os professores a dar um maior número de aulas ou trabalhar mais
tempo sem que formalmente se aumente a dita carga horária. E
nem falo da possibilidade de manipular novamente o currículo do Ensino
Básico e Secundário de forma a, como foi feito com os grupos de EVT do
2º ciclo e de ET do 3º no ano anterior, pulverizar todo um conjunto de
professores e as suas hipóteses profissionais com umas simples linhas de
um decreto. Basta decidirem cortes de uma ou duas horas aqui e ali para
se varrerem milhares de horários de profissionais qualificados a quem
se nega um futuro, com pretextos sem qualquer fundamentação pedagógica.
Há quem diga que Nuno Crato era demagogo
na sua forma de analisar a Educação antes de ser ministro. Discordo.
Acho que fazia críticas em grande parte correctas. Próprias da demagogia
tem sido diversas das suas aparições públicas, no Parlamento ou na
Comunicação Social (relembro em especial uma muito útil entrevista de
Mário Crespo na SICN destinada a lavar mais branco o episódio dos horários-zero),
nas quais optou por utilizar a linguagem para dissimular actos
concretos de agressão ao sector da Educação e que (para além dos efeitos
a curto prazo sobre os professores) a médio prazo terão consequências
graves para os alunos e para a sua formação.
Lamento que Nuno Crato se tenha
transformado em mais um agente das Finanças na governação da Educação,
revelando-se incapaz de travar a amputação da Escola Pública e parecendo
rendido a entregar importantes fatias suas a interesses privados que
tem sido evidente estarem mais preocupados em gerar lucros próprios do
que fazer serviço público.
Lamento que Nuno Crato se tenha rendido à
Situação, colaborando na mistificação da opinião pública e alienando
aqueles que mais confiaram nele e que estavam dispostos a colaborar,
mesmo com sacrifícios, numa renovação da Educação em Portugal que não se
cingisse a cálculos de mau contabilista. E a quem reponde com meneios
linguísticos pós-modernos.
Nuno Crato tornou-se um agente
activo do desinvestimento na Educação. Não sei se por perceber isso ou
por outra qualquer razão, optou por um quase completo desaparecimento.
Em vez de implodir a burocracia, implodiu-se.
O país ficou a perder. Muito. Para além
de qualquer interesse corporativo, pois sou encarregado de educação e
lamento o modelo de escola, despersonalizada, concentracionária, que a
minha filha está obrigada a frequentar."
aqui.
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