"NA ÚLTIMA crónica falei dos ricos que ganharam as suas fortunas às claras, mas outros há, como Rui Pedro Soares, Duarte Lima, Armando Vara, Dias Loureiro, Oliveira e Costa e Isaltino Morais, sobre quem recaem suspeitas de corrupção ou outras formas de enriquecimento ilícito. Temos ainda o exército de indivíduos, metidos em casos como o Freeport, o Magalhães e a Parque Escolar, sobre o qual se abateu uma misteriosa penumbra. Isto para não falar de um tal Domingos Névoa que levou muita gente a concluir que o melhor é jamais denunciar indivíduos corruptos.
Há zonas ainda mais cinzentas. Pode o dinheiro acumulado nada ter de ilegal, o que não quer dizer que a forma como se montaram certos negócios seja moral. Basta pensar nas PPP, que levaram a que encargos exorbitantes recaiam sobre contribuintes inocentes – como eu, os meus filhos e os meus netos - para se perceber o fundamento do ressentimento popular. Não só muitos presumíveis corruptos nunca são julgados – ficando em liberdade até ao momento em que o crime prescreve – como são aprovadas leis que, em vez de tornarem ilegais casos de promiscuidade entre o público e o privado, permitem a pratica. Nos últimos anos, entre deputados, ministros e empresários forjou-se um pacto que faz com que seja quase impossível meter na cadeia quem usa a sua posição política para enriquecer.
Como se isto não bastasse, há os salários dos políticos. Devo reconhecer que não são particularmente elevados, embora, tendo em mente o que a maior parte deles faz, me pareçam excessivos. Ao dinheiro que recebem, tem de se juntar os privilégios de que auferem, tais como reformas a meio da vida, carros espampanantes e motoristas a toda a hora. Há, finalmente, gestos simbolicamente mortíferos. Será que, antes de ter decidido participar no louvável esforço da minha Junta de Freguesia, no sentido de dar comida às famílias necessitadas, a Assembleia da Republica não anteviu que a oferta dos restos de porco preto, de gambas e de ananases, deixados pelos deputados na travessa, são uma afronta?
Quem conheça a nossa História percebe rapidamente por que motivo a ideia de que se pode enriquecer com o trabalho não tem raízes. Há tempos, uma amiga minha, que dá aulas no Ensino Básico e Secundário, contou-me o seguinte. Depois de uma prelecção aos alunos sobre a necessidade de se estudar para subir na vida, um deles perguntou-lhe: «Ó stora onde é que se faz o dinheiro?». Satisfeita por ter captado a sua atenção, respondeu-lhe, «Na Casa da Moeda», após o que lhe explicou o processo de impressão e de cunhagem, um aditamento que não pareceu interessar-lhe. A certa altura, o jovem quis saber onde ficava a tal Casa. Ela deu-lhe a morada e repetiu que, se tivesse boas notas, certamente que lá arranjaria um emprego. Eis o que se seguiu: «Tem razão, stora, primeiro candidato-me, depois entro e, uma vez lá dentro, gamo o dinheiro todo que lá houver». Não pensem que se estava a fazer de engraçadinho. Vivo num país moralmente indigente."
Expresso» de 7 Jul 12
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