"Questão prévia: as charter schools
são mais equivalentes a escolas com contrato de associação e não a
escolas públicas com gestão privada. Esse equívoco tem sido reproduzido
em alguns ambientes, mas é apenas isso mesmo: um equívoco. Estas
“escolas independentes” são algo diferente, pois afirmam querer
concessionar escolas da rede pública a entidades privadas, mesmo que
formadas por grupos de professores.
Em que países está em vigor este modelo?
Este modelo, nos termos anunciados, não
está em vigor em qualquer país, pelo menos da maneira que foi anunciada
e que é enganadora. Há experiências próximas, em especial na Inglaterra
nos últimos anos, mas não se trata de “grupos de professores” a gerir
as escolas. Na Holanda ou Suécia a rede pública de ensino tem uma grande
componente de gestão privada, mas é por grupos privados, empresas,
cooperativas, não propriamente por “grupos de professores”. Uma escola
pública gerida por um projecto criado por “professores” é uma escola com
contrato de autonomia.
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Há algum país que tenha recuado na aplicação deste modelo? Qual? Porquê?
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O que temos é países que recuaram na
desregulação da gestão das escolas, voltando a uma maior centralização e
a parâmetros mais uniformes. É o caso da Suécia desde 2011 por causa da
forma como este modelo levou à fragmentação da rede, à criação de
guetos educacionais em nome da identidade dos projectos e à degradação
dos resultados globais do sistema sueco nos testes internacionais (PISA,
TIMMS, PIRLS). O argumento de isso ser causado pelo aumento das
comunidades imigrantes é usado como desculpa mas, nesse caso, entre nós
serviria para não aplicarmos, de modo algum, tal tipo de medidas. No meu
blogue tenho divulgado factos, estudos e dados que demonstram isso, não
sendo questão de “opinião” ou “preconceito” meu.
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Como funcionam estas escolas?
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Teoricamente e reforço o teoricamente,
pois não se percebe exactamente do que falou o ministro Portas, seriam
escolas em que “grupos de professores” assumiriam a gestão da escola,
através de um contrato com o MEC, definindo o seu projecto educativo e a
organização curricular e pedagógica sem perder os referenciais
nacionais, apresentando metas de sucesso a atingir. No final do
contrato, seria feita a avaliação e o contrato seria renovado ou não. A
questão é que este modelo não se distingue de um contrato de autonomia
feito a sério. A única diferença é a transferência da gestão para uma
entidade privada, seja um grupo de professores associados em cooperativa
ou como testas de ferro de um grupo empresarial.
Nos países em que há este modelo, como é que se processa a
candidatura para ficar com a concessão das escolas e como é feita a
gestão das mesmas em termos de orçamento?
Como disse, este modelo específico não existe. Se tomarmos com comparação as charter schools
americanas, a candidatura pode ser apresentada a diversas entidades
(locais, estaduais e/ou federais). Nos países europeus, os casos mais
próximos passam por uma aprovação por parte da tutela. Mesmo quando se
trata de escolas municipais como na Suécia.
Neste modelo, é possível as escolas seleccionarem os alunos? Como?
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Prestando serviço público não deveriam
seleccionar as admissões. Em caso de excesso de procura, deverão ser
usados critérios como a proximidade da residência, a existência de
familiares já na escola ou o sorteio.
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Que vantagens tem este modelo?
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Em relação aos contratos de autonomia
levados a sério ou contratos de associação já existentes não vejo
qualquer vantagem particular.
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Que desvantagens tem este modelo? Que riscos comporta?
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O principal risco é a entrada,
encoberta, de grupos privados na gestão de estabelecimentos da rede
pública. Pode parecer uma reserva mental de tipo ideológico, mas
considero que o Estado não deve alienar a prestação de serviços públicos
a privados, em especial quando isso desarticula por completo a
coerência de um sistema que não é assim tão grande. Penso o mesmo em
relação à gestão privada de centros de saúde, de esquadras de polícia,
tribunais ou da segurança social. As PPP entre nós têm um historial bem
sintomático da lógica que preside a este modelo de gestão. Relembremos
os casos dos hospitais concessionados…
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Qual é a grande diferença entre estas charter schools e os contratos de associação que há em Portugal?
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Não há muitas. As charter schools
são escolas privadas que concorrem a contratos com o Estado tal como as
escolas com contrato de associação. A maior diferença está no facto de,
nos EUA, a avaliação do cumprimento ser feita a sério e não como cá, em
que nunca se ouviu falar em qualquer escola fechada por não cumprir os
termos do contrato, até porque esse contrato é vago e se limita a
condições vagas de funcionamento.
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Isto representa na prática uma desresponsabilização do Estado em relação à escola pública?
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Obviamente que sim. Desresponsabilização e desorçamentação,
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Acredita que haverá grupos de
professores interessados em concorrer a estas concessões? Ou apenas
grupos económicos terão capacidade para gerir estas escolas?
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Não acredito que exista qualquer “grupo
de professores” interessado num contrato que não lhes traz qualquer
vantagem em relação a um contrato de autonomia. Apenas se funcionarem,
tal como afirmei, como testas de ferro de grupos económicos, com esta ou
aquela orientação ideológica ou confessional.
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Faz sentido dizer que este modelo vai «devolver as escolas aos professores»?
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Não faz qualquer sentido. É uma fórmula
demagógica para enganar a opinião pública. Devolver as escolas aos
professores passaria por uma reforma da legislação relacionada com a
administração e gestão escolar da rede pública."
aqui.
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