"No meu livro "O Desencanto dos
Professores" (procurar em www.ensino.eu - loja virtual), reúno um
conjunto de artigos de opinião, que foram escritos nos últimos
cinco anos, numa conjuntura que considero das mais hostis para os
profissionais da educação em Portugal.
Vai levar tempo para erguer, acima
dos tornozelos, a auto estima dos professores, para recuperar a sua
imagem social, e para chamar novamente à profissão os melhores e os
mais capazes. As perdas são, em tempo, custo e envolvimento de
recursos humanos, incalculáveis. O tempo, a seu tempo, o dirá.
O pior que pode acontecer a um povo
é perder a sua memória colectiva. Vale a pena, então,
lembrar...
A ideia lançada, inicial e
subliminarmente, de que os professores eram uns "madraços", que
acumulavam incontáveis faltas ao serviço, que gozavam férias e
mordomias só permitidas a grupos privilegiados, e que desperdiçavam
os enormes meios financeiros com eles despendidos, constituiu a
maior ofensa, a mais inqualificável infama perpetrada perante uma
classe altruísta, que todos os dias, no seu posto de trabalho, deu
o seu melhor pelo aperfeiçoamento das qualificações dos portugueses
e pelo desenvolvimento social, económico e cultural do seu
país.
Não é novidade. O cenário
revelava-se propício e constituiu a porta aberta para o que se lhe
seguiu: alteração e aumento compulsivo de funções e tarefas
cometidas aos docentes, colocando-os na vertigem da
desprofissionalização; divisão da classe, através de uma
estratificação artificial da carreira; implementação de processos
de avaliação de desempenho administrativos, burocráticos e
estigmatizantes; redução artificial de cargas horárias e alterações
aos planos curriculares ao sabor das circunstâncias, provocando-se,
desnecessariamente, o maior desemprego conhecido, até hoje, na
classe; introdução de novas tecnologias na escola, sem formação
antecipada dos intervenientes no acto educativo, no que se revelou
ser uma insensatez face ao esbanjamento de dinheiros públicos em
negócios e parcerias com empresas privadas…
Desde então, escola tendeu para um
espaço de desencantos e desencontros, onde os profissionais da
educação começaram a ser chamados para reflectirem pouco sobre o
acto educativo e, em substituição, a reunirem muito em redor da
aplicação de normativos e procedimentos de natureza
burocrático-administrativa.
Neste quadro, milhares de docentes
preferiram solicitar a sua aposentação antecipada, com graves
penalizações nas suas pensões, no que constituiu uma desnecessária
sangria de quadros qualificados e experientes. Ou seja: ao abandono
precoce das escolas por parte dos alunos, temos agora que
acrescentar o abandono precoce da profissão por parte dos
professores.
E isto tudo, num país que ainda
precisa de muita escola e de mais e melhor qualificação dos seus
cidadãos. Que desperdício inqualificável formar um docente para
deixá-lo partir para uma aposentação precoce, numa etapa da sua
carreira em que revelava mais controlo, segurança e
maturidade….
Nesse mesmo período, o
descontentamento trouxe à rua mais de cem mil professores no que
foi considerada a maior manifestação da classe desde a alvorada da
democracia, proliferaram os movimentos de docentes à margem das
organizações sindicais tradicionais, e as redes sociais e os
blogues de professores constituíram o elo de ligação de um grupo
profissional que, apesar de tudo, recusou cruzar os braços e
preferiu levantar a voz da indignação e envolver-se na defesa de
uma escola pública onde seja gratificante ensinar e compensatório
aprender.
Por essas e outras razões, o autor
destas linhas entendeu, nesse conturbado período do ciclo de vida
dos professores e das escolas, escrever estes artigos, para dar um
contributo positivo no sentido de ajudar à melhoria do bem-estar
pessoal e profissional dos docentes portugueses.
Os professores nem tanto precisavam
que os amparassem. Os professores precisavam, isso sim, de uma voz
que lhes dissesse: "nós compreendemos o vosso esforço, o vosso
empenho, apesar de todos sabermos que nem tudo vai bem no reino da
educação…". Porém, essa voz, como se sabe, nunca veio da
tutela…
Hoje, com um olhar mais
distanciado, e apesar da adversa conjuntura, estamos em crer que se
alguém quis quebrar a espinha dorsal aos docentes não o conseguiu.
E, em boa verdade, também não houve uma quebra significativa da
confiança que a sociedade deposita nos professores e na instituição
escolar. Diríamos mesmo que a escola continua a ser a única
organização pública onde as famílias entregam, diariamente, os seus
filhos e partem tranquilas para o trabalho, sabendo que crianças e
jovens ficam seguros e bem entregues.
Mas será que, após este
claustrofóbico período, a tutela pode afirmar que temos mais escola
e melhor educação?
Infelizmente a resposta é: não! Nos
tempos que ainda correm, as escolas fecharam-se num clima
organizacional sufocante, os alunos não melhoraram globalmente, de
facto, os seus resultados escolares, os professores não
aperfeiçoaram as suas competências profissionais e a escola não se
transformou numa verdadeira comunidade educativa.
Ou seja: agora temos menos escola e
menos escolas, temos menos educação e menos professores.
Entretanto, nesta encruzilhada, o país ganhou a maior taxa de
desemprego alguma vez vista na profissão docente, e um medíocre
sistema de formação de professores, incapaz de atrair os candidatos
mais capazes e mais competentes.
Mas porque a educação e os
professores são semente e pão de todos os futuros, estamos em crer
que, uma vez mais, os docentes portugueses irão sabiamente
ultrapassar este difícil instante da sua longa história
profissional, e recuperarão o valor e energia da sua
profissionalidade, para bem do desenvolvimento social, cultural e
económico do nosso país."
aqui.
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