As mais recentes medidas da tutela que
visam o regresso a uma concepção conservadora do papel da escola e
da função dos docentes (aumento do número de alunos por turma,
segregação por níveis de aprendizagem, entre outros) colocam na
ordem do dia, e uma vez mais, a defesa da escola
pública.
Não estranha, que nesta escusada conjuntura de
desalento e de fortes emoções, os profissionais do ensino com mais
consciência social e cultural vejam os perigos que espreitam a
escola democrática, erguida sobre a estrutura de ensino elitista
que o Portugal do após Abril herdara da ditadura.
Convenhamos que o então ainda sonho de pensar uma
escola que promovesse a igualdade de oportunidades e atenuasse as
desigualdades sociais se viria a revelar como um dos grandes mitos
educativos das últimas décadas do século XX.
Porém, tal não invalida que, mesmo os mais cépticos,
não reconheçam que as democracias europeias estão longe de poder
inventar uma outra instituição capaz de corresponder, com tanta
eficácia, às demandas sociais, quanto o faz ainda hoje a escola
pública de massas.
Mesmo sabendo que fenómenos mais ou menos recentes,
como o são o abandono e o insucesso escolar, a reprodução das
desigualdades dentro da comunidade educativa, a incapacidade de
manter currículos que valorizem para a vida, a erosão das
competências profissionais dos docentes, acompanhada pela perda de
estatuto remuneratório e social, são problemáticas que colocam em
causa os pressupostos dessa mesma escola pública.
Hoje, a vida nas escolas é muito menos atraente para
quem nelas estuda e trabalha e a desmotivação dos professores e dos
educadores acentua-se com a degradação das suas condições de
trabalho.
Todos sabemos, ou julgamos saber, como deve ser e o que
deve ter uma escola pública que promova a aprendizagem efectiva dos
seus aprendentes e o bem-estar e a profissionalidade dos seus
formadores.
Todavia, há uma questão que introduz toda a entropia
nestas instituições, e esta surge quando os governos se deitam a
fazer contas sobre quanto custa garantir esses direitos. Sobretudo,
quando os políticos sabem que todo o investimento em educação só
produz efeitos a longo prazo.
Não queremos uma escola pública que seja de baixa
qualidade. Por isso estamos com todos aqueles que afirmam ser
urgente relançar a escola pública pela igualdade e pela democracia.
Uma escola que seja exigente na valorização do conhecimento, e
promotora da autonomia pessoal. Uma escola pública, laica e
gratuita, que não desista de uma forte cultura de motivação e de
realização de todos os membros da comunidade escolar. Uma escola
pública que reconheça que os seus alunos são também o seu primeiro
compromisso, que seja lugar de democracia, dentro e fora da sala de
aula, que se revele enquanto espaço de aprendizagem, e que se
envolva no debate, para reflectir e participar no mundo de
hoje.
Formar a geração de amanhã não é tarefa fácil. Mas será
certamente inconclusiva se escrutinarmos a escola e o trabalho dos
professores apenas segundo critérios meramente economicistas,
baseados numa filosofia de desenvolvimento empresarial. A escola é
muito mais que isso: é filha de um outro espaço social e de um
outro tempo matricial. Logo, se o quisermos, neste assunto nada se
deveria confundir, quando claramente estabelecidas as fronteiras
sociais do quadro de competências e dos objectivos de missão de
cada uma daquelas instituições.
Defender a escola pública,
nesta conjuntura de inexplicável desvario, é muito urgente. Para
tal, revela-se necessário que voltemos a exigir políticas públicas
fortes, capazes de criar as condições para que a escolaridade
obrigatória seja, de facto, universal e gratuita e se assuma, sem
tibiezas, que o direito ao sucesso de todos é um direito fundador
da democracia e do Estado português.
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