sábado, 4 de janeiro de 2014

coisas [da educação]... 'como o eduquês agrava a desigualdade'... de avelino de jesus...!

"Pelos resultados e pelos instrumentos (agentes actuando no sistema) a política educativa teve uma clara natureza de classe e foi socialmente devastadora para os alunos e para a população de estatuto económico-social mais baixo.

Apesar dos investimentos massivos na educação nas últimas décadas, a desigualdade social do nosso aparelho educativo não é só continua, intoleravelmente, elevada como tem vindo a piorar.

Estes factos, que evidencio neste artigo, contradiz a argumentação cerrada do eduquês(a) que tem presidido à política educativa desde a reforma Veiga Simão, segundo a qual, eventuais perdas de qualidade, disciplina e liberdade se justificaria pela equidade de ganho certo.

Recentemente, dados da Comissão da UE e da OCDE - que resumo na tabela - permitem lançar um olhar rigoroso sobre a equidade actual dos aparelhos educativos e a sua evolução na última década. Escolhi os dados mais relevantes para a apreensão da equidade: a transmissão para os adultos do baixo nível educativo dos pais, o grau de inclusão social das escolas e a intensidade da influência do estatuto económico-social sobre os resultados na matemática. Embora estes dados foquem apenas ao nível do ensino básico (9 anos de escolaridade) eles são representativos do comportamento global do sistema.

Confirmamos agora que o eduquês - cuja principal defesa argumentativa tem sido a equidade - não só não retirou Portugal da pior posição da Europa como agravou a desigualdade absoluta do sistema.

Podemos, seguindo a tabela, resumir a posição portuguesa:
• O maior peso da herança do nível educativo dos pais sobre o nível atingido pelos filhos: 68% dos filhos de pais com baixo nível educativo não conseguiram ultrapassar aquele nível, contra a média na Europa de 29%.

• O 3º pior índice de inclusão social: 68,6% para uma média europeia de 76,9%. Acresce que entre, 2003 e 2012, o país viu agravada a situação sendo aquele que registou a pior variação: o indicador desceu 8 pontos percentuais contra um aumento na média europeia de 0,2 p.p.

• O 4º pior indicador do peso da influência do estatuto económico-social sobre os resultados escolares: 19,2% contra a média europeia de 13,8%. Entre 2003 e 2012 este indicador agravou-se +1,1 pontos percentuais (contra uma melhoria média na Europa de -1,7 p.p.), sendo o país o 4º com pior evolução.

Décadas de eduqês não trouxeram a prometida equidade mas o seu contrário. Este processo perverso, por razões ilegítimas, continua a ser escondido da opinião pública. Nem a recente divulgação dos resultados do PISA 2012, com um volume especificamente dedicado à equidade, parece ter despertado a atenção dos media. 

Trazer ao conhecimento geral estes dados é fundamental. Em particular, eles devem estar presentes  na discussão sobre a tentativa em curso de reduzir certos aspectos do eduquês. Na verdade, o argumento mais usado para oposição à mudança é a suposto defesa duma suposta mas inexistente igualdade.

A intolerável desigualdade do actual sistema justifica a mudança. Algo de diferente deve ser feito no sentido da liberdade, da descentralização e da responsabilização dos indivíduos.

Pelos resultados e pelos instrumentos (agentes actuando no sistema) a política educativa teve uma clara natureza de classe e foi socialmente devastadora para os alunos e para a população de estatuto económico-social mais baixo.

As reformas visando inverter, com uma forte base moral, a política educativa centrada no eduquês têm suporte empírico seguro.
                 
(a) Por eduquês entendo o processo de massificação do ensino - ocorrência necessária e bem-vinda - conduzido de forma particular, caracterizada por: a) centralização, uniformização e burocratização, b) controle ideológico dos conteúdos, c) facilitismo nos objectivos, conteúdos e avaliação, d) métodos pedagógicos negadores do valor do esforço, da competição, da selecção e do prémio, d) afastamento da escola do processo produtivo e) redução drástica da selecção social pela educação abandonando para a família e a economia o papel de transmissão do estatuto económico-social."



Economista e professor do ISEG


Sem comentários:

Enviar um comentário