Resultados da Sondagem | O ensino vocacional deve manter-se no ensino básico?by Alexandre Henriques |
Ficam os resultados e a análise de Paulo Guinote. Obrigado por votarem ;)
Vocações Precoces
Estou
em claro desacordo com aqueles colegas que acham que o vocacional, sim
senhor, até pode continuar, desde que lhe sejam feitas algumas
alterações, alguns remendos, que o tornem melhor. O meu problema é que
não sei bem que alterações podem ser feitas de modo a tornar algo que
está, em meu entendimento, errado na sua própria lógica, muito em
especial no que se relaciona com o Ensino Básico.
Se
me disserem que o vocacional, neste sistema pretensamente dual, pode
ser aplicado no Ensino Secundário, a alunos com mais de 15 anos, em
situação de pré-entrada no mercado de trabalho após os 18 anjos, ainda
posso aceitar. Mas como solução na partir dos 12-13 anos, no Ensino
Básico acho-o uma mistificação, uma fraude completa, um engano servido
aos alunos e respectivas famílias como saída para o insucesso escolar e
às escolas e professores como solução para “limpar” esse insucesso das
pautas de provas finais e circunscrever a maioria dos alunos
problemáticos a turmas específicas, deixando em paz as restantes. Algo
cuja aceitação pode ser compreensível em quem está muito desgastado com
todo o peso do quotidiano, mas que está longe de ser uma solução
razoável a médio prazo em todos os restantes aspectos. Não me parece que
a fórmula “então, onde é que os metemos e o que fazemos com eles?” seja
o método mais adequado para lidar com o risco de abandono e insucesso a
partir do 2º ciclo de escolaridade, enquanto se finge que as “vocações”
precoces são exactamente aquelas que se encaixam no perfil de
qualificações ou 2vocação” dos professores disponíveis para levar estes
projectos adiante. Mas podemos fingir. E auto-avaliar como bom, ou mesmo
a raiar a excelência, aquilo que mais não é do que um truque e que, na
prática concreta de muitas realidades, é apenas uma fast lane
para despachar alunos com um mínimo de competências gerais e um
certificação vocacional que nenhum empregador leva mesmo a sério. Há
excepções, claro que há excepções. Se não existissem, nem dávamos pelas
regularidades.
Vou
procurar explicar de forma breve porque acho que no plano macro e micro
os alegados cursos vocacionais até podem ser “úteis” na base de uma
forma errada – e barata – de lidar com as estatísticas do insucesso e
abandono escolar, ao mesmo tempo que se pisca o olho aos professores que
querem expurgar as suas turmas de indesejáveis, pelo que apoiam a sua
arrumação algures.
No
plano da macro-escala, o encaminhamento de alunos com historial de
insucesso para turmas de “ensino vocacional” é um modo de lhes dar um
caminho que, evitando os exames ou provas finais, traz vantagens no
curto prazo a todos. Os alunos porque ficam com o sucesso quase
garantido (são muitas as exigências formais de rigor que na prática de
quem aparece a inspeccionar não passam de garantias de responsabilização
dos professores pelo insucesso dos alunos) e o Ministério da Educação
porque pode apresentar estatísticas maravilhosas de certificação de tipo
profissionalizante, sem que seja feito investimento sério numa
verdadeira formação profissional a partir das escolas. Para os mais
distraídos, esses dinheiros passaram a seguir para outros alfobres, os
das formações dadas nas próprias empresas que nunca dariam um posto de
trabalho sem verificação prévia de competências que estágios de um mês,
arrancados a ferros, não podem garantir. Salvo as tais excepções. A via
vocacional que nasceu da crítica aos CEF e PCA, negando-lhes as
adaptações que agora querem para ela, tem problemas maiores para
resolver do que aquelas vias tinha, Para além de quem amputa de forma
bem mais precoce a formação básica dos alunos em áreas gerais do
conhecimento em troca de um afunilamento para formações “específicas”
que fazem pouco sentido ou terão dificuldade em progredir sem noções
fundamentais das tais disciplinas gerais. Não é a partir do 5º, 6º ou 7º
ano que se trunca alegremente um currículo generalista – retirando-lhes
a História, a Físico-Química ou reduzindo os conteúdos da Matemática e
do Português a caricaturas – sem consequências a médio e longo prazo. A
concepção de ensino subjacente ao vocacional é do mais oitocentista
possível.
À
micro-escala, a criação de cursos vocacionais resulta da combinação da
pressão da tutela sobre os órgãos de gestão no sentido de assegurarem
essa “oferta” e assim coreografarem um combate ao “insucesso” em troca
de uma avaliação de excelência nas lideranças, com a sensação de alívio
que traz uma “alternativa” que arruma os alunos mais problemáticos em
turmas “especiais”, para que seguem tanto professores que até tentam
fazer o seu melhor nestas condições quanto outros que, na ausência de
pessoal voluntário disponível, se vêem a braços com grupos de alunos
heterogéneos, com perfis de aprendizagem muito diversos, sem uma
verdadeira coerência “vocacional” para as áreas específicas disponíveis.
Sendo que as exigências formais de rigor na assiduidade e avaliação,
com alunos que têm um percurso contrário a esse tipo de práticas,
desaguam quase sempre num malabarismo por parte dos DT e dos professores
para simularem que a falta de assiduidade foi justificada e que a
avaliação é mesmo uma avaliação e não mais uma simulação porque, afinal,
aqueles alunos não estão ali para terem insucesso outra vez. E eles
rapidamente percebem isso e todos os vícios de um sistema destes. O que,
depois, lhes falta perceber é que ou a formação específica e
pretensamente profissionalizante de nada lhes vale aos 14-15 anos e aos
17-18 só serve para terem um certificado na gaveta, pois a generalidade
dos empregadores não a leva a sério e dificilmente a considera um factor
decisivo na contratação do seu pessoal. Salvo, excepções, claro, que
são sempre excepcionais.
Mas
podemos fingir. Ou levar as coisas a sério, cheios de boas intenções, e
ficarmos a pensar que aquilo que vemos não é a a realidade, que a
realidade são os papéis a dizer o contrário.
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