Os
mesmos que escrevem isto têm, geralmente, outras verdades na cabeça: o
sistema público não presta porque há laxismo entre os professores,
porque há excesso de gastos, porque há reformas a mais, porque há um
domínio do chamado "eduquês" - comandado pelo funcionalismo do
Ministério da Educação - que ridiculariza os programas e os currículos
escolares, porque há excesso de carreirismo e poucas vocações entre quem
ensina, porque há corporativismo a mais na classe docente.
Na
sequência lógica deste pensamento surge o aplauso incondicional a todas
as medidas, vindas de qualquer ministro, que vagamente cheirem a "meter
os professores na ordem", "virar o ensino para o que realmente interessa
(e o que interessa, segundo esta visão, é a Língua Portuguesa, a
História, a Matemática e pouco mais), "poupar recursos" ou "acabar com a
força excessiva dos sindicatos".
Nenhuma destas almas acha
contraditório escrever também, a propósito da crise financeira e
económica que estamos a viver e do desemprego jovem a ela associada,
este novo lugar-comum da opinão publicada: "Estamos a mandar para a
miséria a geração mais bem preparada de sempre." Quem preparou tão bem
estes jovens? Não foi o sistema de ensino que tanto condenam?...
O
ministro Nuno Crato anunciou mudanças profundas para o ano letivo que
vem, que foram imediatamente aplaudidas por vários escribas meus
colegas. Eu olho para aquilo e só vejo um processo de mandar para o
desemprego 18 a 20 mil professores, coisa que me parece, no mínimo,
perigosa.
Olho para aquilo e vejo um desastre em potência com a
criação de um número ainda indeterminado de mega-agrupamentos, para
centralizar a gestão de várias escolas num único órgão dirigente, o que,
aposto, só vai aumentar o descontrolo e a ineficácia.
Olho para
aquilo e vejo turmas com 26 alunos no primeiro ciclo e 30 nos outros
anos e tenho a certeza (e não, não preciso ser um pedagogo para ter
razão) de que ninguém consegue ensinar em condições com tanta gente numa
sala.
Muitos dos defeitos apontados atrás são incontestáveis, mas
o sistema público de ensino prepara maior número de jovens, durante
mais tempo e melhor do que conseguia quando eu fui estudante ou quando o
meu pai estudou. São anos-luz de diferença. O que Nuno Crato apresenta
é, na prática, andar para trás no tempo."
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