no observador...
"“Os pais do aluno em questão entraram na sala de aulas, no início
da primeira aula da manhã, culparam a professora pelo alegado mau
desempenho comportamental do filho e agrediram-na nas mãos e num braço”,
acrescentou. A maioria dos alunos, de uma turma do 4.º ano da
escola básica do Rossio, que assistiram às agressões, “foram para casa
por questões emocionais”, disse. Os restantes alunos “foram divididos”
pelas outras turmas do estabelecimento de ensino.
Fonte do Centro Distrital de Operações de Socorro (CDOS) de
Santarém confirmou a ocorrência à Lusa. O alerta foi dado às 9h21. Ao
local ocorreram os bombeiros de Abrantes, com um veículo de socorro
e a PSP. Jorge Soares, porta-voz da PSP de Santarém, disse à
Lusa que “a agressora foi identificada e o caso, por configurar um caso
de crime público, vai ser remetido para o Ministério Público”.
Jornal de Notícias, 24 de Setembro de 2014.
Alguém encontrou uma declaração do Ministério da Educação sobre este
caso? E dos sindicatos? Não sei se existiu alguma tomada de posição por
parte dessas entidades, mas a ter existido foi totalmente ofuscada pela
agenda do camarada Mário Nogueira: colocações, listas e outros assuntos
administrativos a que há anos se convencionou em Portugal chamar ensino.
Na prática quando em Portugal se fala de ensino fala-se daquilo que
Mário Nogueira quer. E a Mário Nogueira o Ministério da Educação só
interessa enquanto maior empregador de Portugal, logo o melhor caldo de
cultura para a sua actividade de funcionário público profissionalizado
na contestação em serviço próprio e do partido a que é afecto.
Há anos que isto é assim e só o estado de profunda anomia em que nos
encontramos leva a que não percebamos que nesta notícia cada parágrafo é
um problema, esse sim do ensino e da escola, e sobre os quais ninguém
se pronuncia porque andamos todos a discutir o problema de umas listas
de colocação cujas fórmulas são o que de mais aproximado com o
centralismo soviético se fez em Portugal.
Comecemos pelo princípio: a professora foi agredida dentro da sala. O
que nos leva a perguntar – os pais entram assim pelas salas dentro do
4º ano já com as aulas a decorrer? A professora chamou-os para irem lá
àquela hora, já durante a aula, o que a obrigaria a falar do assunto
diante da turma toda? Nenhum funcionário achou estranha aquela ida dos
pais a uma sala onde estava a ser dada uma aula? Quem na qualidade de
aluno, professor ou pai tem entrado em escolas, sejam elas públicas ou
privadas, percebe que há coisas que não batem certo nesta situação.
Mas as dúvidas e as estranhezas não se esgotam aqui. Passemos para o
que aconteceu dentro da sala de aula. Aí a linguagem da notícia é ela
mesma um símbolo destes bizarros tempos: “a professora ficou ferida nas
mãos e num braço, a par de uma crise de ansiedade emocional.” “Os pais
do aluno em questão entraram na sala de aulas, no início da primeira
aula da manhã, culparam a professora pelo alegado mau desempenho
comportamental do filho e agrediram-na nas mãos e num braço”.
Ora vejamos: a criancinha porta-se mal. Alegadamente, claro, que nós
somos uma sociedade que anda sempre de alegado na boca, não vamos cair
em pecado de chamar alguma coisa pelo seu devido nome: as crianças não
se portam mal. Têm alegados comportamentos. Curiosamente estes pais não
duvidavam do mau comportamento do seu rebento. Acusaram sim foi a
professora de ser responsável pelo mesmo. E agrediram-na. Esta ficou
ferida e, pressurosamente, a notícia acrescenta que ficou também com uma
“crise de ansiedade emocional.” Vai-se a ver e isto ainda se resolve
mandando a senhora para o psicólogo. Psicólogo esse onde também devem
acabar os alunos que assistiram às agressões à professora e que “foram
para casa por questões emocionais”.
Uma professora é agredida diante dos alunos e quer ela quer as
crianças têm “questões emocionais”! Vendo bem é tudo uma questão de
emoções mal geridas: os pais agressores, coitadinhos, têm emoções a
mais. A professora agredida teve uma crise emocional e as crianças que
assistiram àquilo tudo também se emocionaram muito. Os respectivos pais
ainda se devem ter emocionado mais quando perceberam que os seus filhos
não tinham aulas e eles tinham de resolver o assunto, independentemente
de estarem a trabalhar ou de terem compromissos… Enfim é tudo uma
questão de gerir as emoções. Infelizmente só não sabemos se a criança
que está na origem disto tudo foi para casa com “questões emocionais” ou
ficou na escola á espera que os paizinhos voltassem de novo. Qual
indisciplina, qual falta de respeito, qual abuso… são emoções, senhores.
Depois vem o habitual nestas coisas: bombeiros e a PSP acorreram ao
local, “a agressora foi identificada e o caso, por configurar um caso de
crime público, vai ser remetido para o Ministério Público”. E o
habitual nestas coisas é um dos maiores paradoxos do nosso tempo: a
Justiça, que não investiga o que é da sua exclusiva competência, ora
porque prescreveu, ora porque as provas são dadas como nulas e mandadas
retirar dos autos cada vez mais, tem vindo a ocupar os outros espaços de
poder.
Incidentes que durante anos foram resolvidos pelos directores das
escolas acabam agora nos tribunais. Que é o mesmo que dizer que, se o
CITIUS deixar, daqui a largos meses ou anos o caso terá algum desfecho.
Isto se entretanto não for arquivado. Não estou a dizer que se tal
acontecer a justiça procedeu mal. Estou sim a frisar que não podemos ser
uma sociedade em que o bem e o mal são definidos pelos tribunais. Em
que não nos restam outras figuras de autoridade senão os juízes, os
guardas prisionais e o fisco. Logo uma sociedade em que aquilo que não é
judicialmente investigado não tem relevância moral ou social e em que
se exige que os tribunais condenem a torto e a direito para assim se
compensar o vazio deixado pelo relativismo dos valores e ausência de
poderes intermédios.
E por fim mas não por último não podemos continuar a chamar
sindicatos de professores ao conglomerado do senhor Nogueira, e
Ministério da Educação a uma estrutura que vive de e para a burocracia
dos seus funcionários."
aqui.
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