segunda-feira, 6 de julho de 2015

coisas da educação... (d)a privatização em curso (?) [turmas no privado]... segundo a fenprof...!

Interesses privados alimentados com milhões públicos

Na região centro, as 269 turmas postas a concurso pelo governo para entrega a operadores privados, custarão aos contribuintes, em 2016, mais de 21,6 milhões de euros. Se considerarmos todos os anos de escolaridade de 2.º e 3.º ciclos e ensino secundário, o valor ascenderá, em 2016, a 58 milhões de euros. Estes números foram relevados numa conferência de imprensa realizada, em Coimbra, com a participação de Mário Nogueira.

O MEC vai entregar a operadores privados da região centro, no próximo ano lectivo, 269 turmas dos 5.º, 7.º e 10.º anos de escolaridade. Sendo cada uma financiada em 80 500 euros, o Estado pagará aos privados 21 654 500 euros, sem contar com o financiamento das turmas de 6.º, 8.º 9.º, 11.º e 12.º anos.

Recorda-se que em Novembro de 2012 eram divulgados os estudos de um grupo de trabalho criado pelo MEC, coordenado por Pedro Roseta, em que se avaliavam os custos das turmas nas escolas públicas e privadas, concluindo-se que cada turma, no ensino público, tem um custo médio de 70 648 euros e no secundário o valor médio sobe para 91 421 euros.
De acordo com a Portaria n.º 172-A/2015, o valor do financiamento de cada turma atribuída ao sector privado será de 80 500 euros. Isto é, de acordo com o estudo antes citado, 9 852 euros acima do custo médio das turmas do básico nas escolas públicas e 10 921 euros abaixo do que se estima para aquele valor nas secundárias.
Divulga o aviso de abertura que, nesta região, 228 turmas serão para o ensino básico (106 do 5.º ano e 118 do 7.º) e 45 para o ensino secundário. Assim, tendo como referência, por um lado, o valor do financiamento a atribuir por cada turma que será contratualizada (80 500 euros), por outro, o custo médio por turma no ensino público (a valores de 2009/2010, que baixaram significativamente nos últimos 3 anos com a redução de milhares de professores), conclui-se que os contribuintes, só na região centro pagarão mais 1,8 milhões de euros com a entrega destas 269 turmas de 5.º, 7.º e 10.º anos ao sector privado. Se tivermos em conta as turmas de todos os anos de escolaridade dos ensinos básico e secundário, o acréscimo da despesa do Estado, só em 2016, quase atingirá os 5 milhões de euros.
Poderia admitir-se esta opção como uma inevitabilidade, caso as escolas públicas não reunissem as condições para receber as turmas que são desviadas para os colégios privados. Ainda assim, seria de exigir que, no cumprimento do artigo 75.º da Constituição da República Portuguesa, o Estado se obrigasse a garantir a todos o acesso ao ensino em escolas públicas. O que se verifica é que, nos concelhos em que foram postas a concurso estas turmas, as escolas públicas, salvo raras excepções, têm condições para as receber. Alguns exemplos: no concelho de Coimbra as escolas públicas têm capacidade para mais 80 turmas, mas o MEC vai conceder 48 aos operadores privados; em Viseu, a capacidade das escolas públicas dá para receber mais 22 turmas e o MEC entrega 14 aos privados; na Guarda, a relação é de 8 para 4; em Seia são entregues 4 turmas ao privado, tendo as escolas públicas capacidade para receber mais 31. Esta situação repete-se em Resende, Covilhã, Fundão, Sertã, Anadia, Oliveira do Bairro, Cantanhede, Soure, Ansião, Porto de Mós.
Só em alguns concelhos do distrito de Leiria, com a progressiva instalação de colégios privados, a Escola Pública não acompanhou a evolução das crescentes necessidades da população escolar, decorrentes, designadamente, do alargamento da escolaridade obrigatória. Curiosamente, esta situação ocorre num distrito em que o grupo GPS tem grande implantação. Mesmo assim, o número de turmas que é colocado a concurso ultrapassa as necessidades existentes, tendo em conta a capacidade de resposta das escolas públicas. No concelho de Leiria, tal como no de Alcobaça, anuncia-se a contratualização com privados de mais 13 turmas do que seria necessário; em Pombal, de mais 7; na Batalha, de mais 2; na Nazaré, de mais 1. No caso da Nazaré é de destacar o facto de nunca ter existido oferta pública de ensino secundário, sendo este nível de ensino concessionado, na íntegra, ao colégio aí existente, contrariando a vontade expressa da população.

CONCELHO (1)
N.º DE TURMAS QUE ESCOLAS PÚBLICAS PODEM RECEBER,
ALÉM DO DISTRIBUÍDO EM REDE (2)
N.º DE TURMAS A "CONCEDER"
AOS COLÉGIOS
OBSERV.

5.º ANO
7.º ANO
10.º ANO
5.º ANO
7.º ANO
10.º ANO

Águeda
4
4
----
4
4
----

Alcobaça
----
6
4
----
8
5

Anadia
4
4
2
4
4
2

Ansião
1
1
----
1
1
----

Batalha
1
1
----
3
3
----

Cantanhede
5
5
3
4
4
2

Coimbra
31
30
19
21
22
5

Covilhã
----
1
1
----
1
1

Figueira (Norte)
2
2
----
2
2
----

Fundão
3
3
2
1
1
1

Guarda
4
4
----
2
2
----

Leiria
4
8
1
17
16
2

Nazaré
----
3
----
----
1
4
DRLVT
Oliveira do Bairro
5
4
3
5
4
3

Pombal
2
2
1
10
11
3

Porto de Mós
5
6
7
5
5
3

Proença-a-Nova
2
2
2
1
1
1

Resende
----
10
----
4
DREN
Sabugal
----
2
----
2
2
----

Seia
13
12
6
2
2
----

Sertã
2
2
2
2
2
1

Soure
5
5
2
2
2
2

Viseu
22
7
7
----



(1) Em alguns concelhos da região ainda não foi possível concluir o levantamento de dados. 

(2) Informações recolhidas junto das direcções das escolas/agrupamentos. Por vezes, foi indicada, simplesmente, a capacidade de receber as turmas a concurso pelos privados e não a capacidade total disponível das escolas/agrupamentos que é, na verdade, ainda superior.

Estamos perante uma situação que:
- É inconstitucional, pois viola o artigo 75.º da CRP;
- É despesista, pois, só na região centro, obriga o Estado a desembolsar mais de 5 milhões de euros do que seria necessário;
- Apenas favorece operadores privados, a quem são entregues 58 milhões de euros, que, assim, obtêm o financiamento para os seus negócios à custa do erário público;
- Consolida o processo de privatização do ensino;
- Enquadrada pela designada reforma do Estado, e a par da municipalização, se destina a reduzir ainda mais o número de docentes nas escolas públicas, cumprindo, dessa forma, a imposição do FMI de redução de 173 milhões de euros em trabalhadores da Administração Pública.
Face ao que antes se expôs, o SPRC irá:
- Propor o alargamento deste estudo ao conjunto do país para, no âmbito da FENPROF, serem desenvolvidas iniciativas junto da Assembleia da República, Provedor de Justiça, Procuradoria- Geral da República e Tribunal de Contas;
- Entregar ao seu gabinete jurídico a apreciação deste processo para, eventualmente, se avançar com acções que possam defender o interesse público;
- Apoiar juridicamente os docentes que, nas escolas afectadas por este desvio de alunos para o privado, venham a ficar em situação de horário-zero;
- Apelar aos conselhos gerais das escolas/agrupamentos, bem como às assembleias municipais da região centro, para que tomem posição contra este processo lançado pelo governo;
- Promover e/ou apoiar iniciativas públicas a desenvolver nesta região, que se destinem a contestar a privatização do ensino.

(23.06.2015)
A Direcção do SPRC



precedido de outro comunicado...

Governo prepara o desvio de milhares de alunos para o ensino privado

Foi divulgado o “aviso de abertura ao regime de acesso ao apoio financeiro a conceder em 2015/2016, no âmbito do contrato de associação” dos colégios com o Ministério da Educação. O aviso segue-se à publicação da Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho.
Aquele documento divulga uma listagem, por freguesia, das turmas a consignar, em distribuição de rede, ao ensino privado, em todo o território continental do país, de acordo com o que o governo entende ser o número de “alunos e turmas a considerar no procedimento concursal agora aberto”, o qual, se baseia “no número de turmas que têm integrado essa opção educativa [ensino privado] nas áreas identificadas, nomeadamente nos anos iniciais de cada ciclo de escolaridade”. Ou seja, o MEC estabelece estes limites, mantendo as turmas já existentes nos restantes anos de escolaridade, pelo que o número de alunos e de turmas contratualizados com comparticipação do orçamento do Estado será substancialmente superior ao agora divulgado neste aviso de abertura.
No referido aviso, no seu anexo I, declara-se que o número de turmas a consagrar em contrato de associação, o qual vigorará por três anos letivos é:
Região Norte211 turmas dos 5.º, 7.º e 10.º anos
Região Centro 265 turmas dos 5.º, 7.º e 10.º anos
Grande Lisboa, vale do Tejo e região Oeste168 turmas dos 5.º, 7.º e 10.º anos
Zona Sul 12 turmas dos 5.º, 7.º e 10.º anos
Total nacional de turmas objeto deste concurso656 turmas dos 5.º, 7.º e 10.º anos
Tomando como referência o número de alunos por turma (entre 25 e 28 alunos), o número de alunos abrangidos por esta medida, que só abrange os 5.º, 7.º e 10.º anos, situar-se-á entre 16400 e 18400.
Se tivermos em conta que este aviso de abertura é referente a apenas 3 dos 8 anos de escolaridade integrados nos três ciclos referenciados, pode projetar-se que durante 3 anos o ensino privado será, anualmente, financiado para cerca de 1750 turmas, com o valor (conforme explicita a Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho) de 80.500 euros por turma.
Fica, assim, a saber-se que o governo PSD-CDS/PP projeta financiar anualmente os patrões dos colégios, através do orçamento do Estado, com mais de 140 milhões de euros.
Para além da justeza das objeções à forma como os dinheiros públicos são gastos pelo atual governo, num quadro em que se conhecem várias irregularidades e existiram diversos processos do Estado contra entidades proprietárias dos colégios, existe, hoje, uma rede pública com equipamentos, materiais e recursos humanos capazes de dar uma resposta de qualidade às necessidades educativas e formativas dos portugueses. Importa, por isso, questionar:
a) Sendo a rede definida e distribuída por territórios devidamente identificados, caso o número de alunos existente nesses territórios for idêntico, pouco superior ou inferior ao determinado neste aviso de abertura, são as escolas públicas quem perderá os alunos, podendo vir a encerrar?
b) Caso as famílias optem por matricular os seus filhos nas escolas públicas, serão elas obrigadas a transferi-los para as escolas privadas para que se cumpram aqueles limites fixados?
c) Num quadro de tentativa de municipalização da Educação, confirmar-se-ia a possibilidade de as autarquias definirem o ensino privado como prioridade na distribuição de turmas? E o governo, através das estruturas desconcentradas da DGEstE, irá fazê-lo?
d)  Qual o impacto previsível desta medida relativamente à manutenção de funcionamento dos atuais edifícios escolares públicos?
e)  Qual o impacto no número de professores em exercício de funções em escolas públicas? Quantos irão perder o seu emprego ou passarão à requalificação?
A lamentável situação, agora criada, quer pelo aviso de abertura referido, quer pelo despacho que regulamenta a forma de atribuição e celebração destes contratos de associação, obriga a que todos nos interroguemos sobre as graves consequências que, destes dois instrumentos, poderão resultar. Ao mesmo tempo, é um imperativo nacional pôr em causa todo este processo por três razões fundamentais:


1. O quadro constitucional obriga a que o Estado seja responsável por uma rede pública de estabelecimentos que sirva as necessidades de toda a população. O governo força a consideração de que estas escolas privadas (que têm, inclusivamente, fins lucrativos) são “estabelecimentos de ensino integrante da rede pública” [cf. Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho, art.º 14.º, d)], mas esta habilidade não altera a natureza “não pública e lucrativa” de tais estabelecimentos. Têm sido várias as formas utilizadas pela FENPROF e pelos seus Sindicatos não só para denunciar a imoralidade desta situação, mas também para levantar fundadas dúvidas sobre a forma como os dinheiros públicos contratualizados têm sido utilizados;
2. As escolas públicas existentes no território nacional são, grosso modo, adequadas em número e condições de funcionamento, em recursos humanos e de equipamentos, não se justificando o esbanjamento que o governo faz de dinheiros públicos. Este esbanjamento, que tem uma indisfarçável motivação ideológica, só pode ser entendido como uma forma de alimentar negócios que, vivendo dos impostos dos portugueses, não se inibem, em muitos casos, de explorar, violar acordos e desrespeitar a lei portuguesa no que aos seus trabalhadores diz respeito;
3. Sendo o governo português, como órgão de soberania do Estado, obrigado a garantir o cumprimento da Constituição da República e sendo possuidor de uma rede pública de estabelecimentos de ensino básico e secundário, capaz de satisfazer a quase totalidade das necessidades da população portuguesa, ao ensino privado deverá ser atribuído um papel supletivo, quando satisfaz necessidades que o Estado não garante, ou um papel de opção das famílias, quando as mesmas estiverem dispostas a custear as decorrentes despesas. A alteração do estatuto do ensino particular e cooperativo, imposta pelo governo, não representa o sentir da maioria da população portuguesa e constitui uma opção ideológica. A FENPROF entende que deve ser revogada!

Neste quadro, a FENPROF admite recorrer aos tribunais para impedir a celebração de novos contratos de associação, sejam eles a ampliação dos existentes ou novos contratos com outras entidades privadas; dirigir-se-á ao senhor Provedor de Justiça, apresentando queixa contra o governo português e enviará uma exposição aos partidos políticos com representação parlamentar para que, no quadro das suas atribuições, intervenham no sentido da reposição daquilo que a FENPROF considera ser o interesse nacional e o respeito pela Constituição.

O Secretariado Nacional da FENPROF
18/06/2015 

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