segunda-feira, 3 de agosto de 2015

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Pedro Candeias
Por Pedro Candeias
Coordenador
 
3 de Agosto de 2015
 

Os batoteiros das corridas e o Benfica que não engana ninguém 


Um tipo não desconfia do que vê, ouve, cheira e toca apenas por que sim, mas sim porque antes já viu, ouviu, cheirou e tocou o que o levou à desconfiança. Ninguém nasce ensinado, ninguém nasce cínico, nem uma nem outra condições são condições inatas, como o são ser-se esquerdino ou destro. O cinismo é aprendido e apreendido pela exposição (exposição repetida, aliás) a coisas como esta: entre 2001 e 2012, 800 atletas de elite doparam-se; 146 medalhas em Mundiais de Atletismo e Jogos Olímpicos (dez nos JO de Londres, em 2012) nesse período têm a palavra batota inscrita nelas; 80% das medalhas de ouro, prata e bronze da Rússia foram conquistadas por atletas vitaminados. Os métodos preferidos de quem engana continuam a ser as transfusões de sangue as injeções de EPO, em doses pequeninas e cirurgicamente planeadas no tempo para não dar nas vistas.

Estes números são o resultado de 12 mil análises a cinco mil atletas feitos pela IAAF (Federação Internacional de Atletismo), que tinha a história só para si até alguém decidir dar com a língua nos dentes. E, quem o fez, fê-lo a uma televisão pública alemã, a WDR, e ao Sunday Times, que lhe deu um título que não engana e nem precisa de algodão: "O Segredo Mais Sujo Do Desporto". Há sete meses, a MDR, outra cadeia alemã, tinha posto cá fora todo o programa de dopagem dos russos - Putin não demorará muito a falar de uma perseguição geoestratégica do ocidente ao seu país.

A única boa notícia no meio desta trapalhada química é que não há peixe graúdo na rede: Usain Bolt e Mo Farah, os homens mais rápidos do mundo em distâncias curtas e longas, estão fora das malhas do doping. Ficamos contentes, por eles e por nós, porque, depois disto, estamos todos mais céticos - e cínicos.

Nota mental: Lance Armstrong foi único e agora é apenas mais um entre dopados. A sua vida já deu um documentário e dará um filme.

Agora, quatro 'curtas', (uma, um bocadinho maior do que as outras) da série desporto à portuguesa: 
Esta madrugada, o Benfica perdeu por 3-0 com o Monterrey para a Eusébio Cup, que se disputou no México. Curiosidade: um dos golos do adversário foi marcado por Funes Mori, que já morou na Luz. Acaba assim uma digressão fraquinha dos encarnados pela América: cinco jogos, zero triunfos (nos 90 minutos), uma mão cheia de dúvidas técnicas (que jogadores?) e táticas (4x4x2, 4x2x3x1?) e meia equipa a pedir férias quando para a semana a coisa já é a doer - no domingo, dia 9, há Supertaça, diante do Sporting de Jorge Jesus. "As coisas vão normalizar", disse Rui Vitória. Mais anormais, impossível. 
José Mourinho tinha um registo imaculado frente a Arsène Wenger: zero derrotas. Ontem, somou a primeira, na Supertaça de Inglaterra, um troféu que o português sempre desdenhou por onde passou. 
O FC Porto ganhou por 3-0 ao Stoke City (9º na Premier League 2014-15) mas isso não chegou para levar a Colonia Cup para casa. 
Filipe Cardoso, que é primo de Vanessa Fernandes, ganhou a 4.ª etapa da Volta a Portugal (a mítica subida à Senhora da Graça). Gustavo Veloso continua de amarelo. 


OUTRAS NOTÍCIAS
Calais fica a 34 quilómetros de Inglaterra, uma distância andável para os que migram para um lado como quem foge da morte de outro. As dezenas passam a centenas e, todos os dias, há quem dê saltos de fé quando pula a vedação entre fronteiras. É um problema humanitário, para a Europa resolver, e político, para Cameron tratar - e ele promete mais "cães" e "cercas". Fora de Inglaterra, a contestação aos britânicos cresce; dentro, a tolerância à imigração diminui. E o governo quer que os que vivem ilegalmente no país sejam imediatamente despejados pelos senhorios e expulsos de Inglaterra. Escreve o Guardian: o Reino Unido será um lugar mais difícil para se viver.

Na paradíssima Ilha da Reunião vivem-se dias frenéticos desde que Johnny Begue encontrou um pedaço de uma asa, que não era um flap nem um aileron mas um flaperon. O NYT faz a reportagem num lugar onde tudo o que o mar traz é recolhido para análise - garrafas de água incluídas. Acredita-se que o Índico esteja a devolver à terra o que as suas águas terão engolido naquele voo MH370 da Malaysia Airlines. O mundo està à espera.

Isto já se esperava. Quando a Turquia decidiu abrir guerra em duas frentes (ao autodenomiinado Estado Islâmico e aos rebeldes curdos do PKK), isso virar-se ia contra ela. Não é karma, é guerra, e pode ser das piores - a civil. Um trator armadilhado, conduzido por um suicida, espetou-se contra um quartel, em Dogubayazit. Morreram dois militares, 31 ficaram feridos. A partir de agora, será sempre a somar.

Uma, duas, três notícias nas primeiras páginas dos nossos jornais sobre o caso BES, que parece que foi ontem (porque está sempre connosco) mas já tem um ano: no Público, fala-se da venda atrasada do Novo Banco, porque as ofertas não chegam aos 5 mil milhões de euros; no DN, José Miguel Júdice e Mariana Mortágua escrevem que a escandaleira vai custar uns bons milhões aos contribuintes; e, no I, que os credores terão de esperar para receber o que era deles.

Guardamos o JN para outras núpcias: o casamento de Jorge Mendes esteve à vista de todos e, quem não o viu, pode revê-lo aqui


FRASES
"O terceiro resgate da Grécia está desenhado para falhar." Yanis Varoufakis, com outra camisa à Parker Lewis, em entrevista ao El País.

"Entristece-me não poder testemunhar a nova física nuclear. Tenho frio e perco o apetite; calafrios de dia e suores à noite; e um cansaço generalizado." Oliver Sacks, neurologista e escritor, sobre o cancro que o mata lentamente. O texto chama-se "A Minha Tabela Periódica" e pode lê-lo aqui.

"Quem escolheu esta administração [da Caixa Geral de Depósitos] foi o atual governo. Não fica bem a Passos Coelho comentar a situação" Marcelo 'o-comentador-sou-eu' Rebelo de Sousa, sobre a fúria passista contra a CGD.

"Sabemos como são os portugueses... batoteiros, enganadores" Michel 'Le-Pen-não-diria-melhor' der Zakarian,treinador do Nantes, após o empate com o Marítimo.


O QUE ANDO A LER
Somos pequenos e logo aprendemos o que é a vida e a doença e a morte, porque há sempre alguém que está perto de nós que parte para o Céu ou para os bichos, dependendo o lugar para onde se vai da crença ou descrença de quem nos dá a noticia. Mas nessas histórias, mais e menos racionais, nunca cabem os pais,que são espécie de outra espécie, que nunca adoece, que vive para sempre - que é imortal. E é por isso que nunca estaremos preparados para esse dia. Hector Abad Faciolince não estava. Ele sabia que o pai, que tinha o mesmo nome, era um tipo perseguido pelas suas convicções políticas e sociais, numa Colômbia de outros tempos. Hector, senior, foi assasinado nas ruas de Medellín em 1985; Hector, filho, escreveu-lhe um livro, em 2006.

"Somos O Esquecimento Que Seremos" é o testemunho da infância, adolescência e idade adulta do escritor, contada pela voz de um filho que adorava o pai com "um amor animal", que gostava do cheiro dele e da memória do cheiro dele quando ele estava em viagem e se deitava na cama dele para nela viver aqueles dias que pareciam meses e anos. Os elogios são constantes, a adoração e adulação também - o pai é um super-herói de uma infinita bondade e caridade e nele não se encontram defeitos apenas virtudes e meias-virtudes. É perfeito. O livro também o é.

Amanhã, o João Vieira Pereira, que continua a demanda pela pancada perfeita (o hole-in-one), trazer-lhe-á o que de melhor e pior se passa lá por fora e cá por dentro. Como o João é das Economias e das Gestões, desconfio que pouco de bom nos terá para contar um dia depois da abertura da bolsa na Grécia

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