terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

coisas da (des)educação... tudo corre sobre rodas...?


no público 'online'...


“O problema é muito simples: nós na prática abandonámos o sector privado”. A denúncia é do presidente do Sindicato dos Inspectores da Educação e do Ensino (SIEE), José Calçada, segundo o qual esta é uma das explicações para a sobre-representação dos colégios nas listas de escolas que inflacionam as notas dos seus alunos. O Ministério da Educação e Ciência (MEC) recusa a ideia e sublinha que, pela primeira vez, as escolas privadas vão ser alvo de uma inspecção sobre este tema.

Há duas semanas, um trabalho do PÚBLICO demonstrava que há 24 escolas, das quais 14 privadas, onde os professores dão, todos os anos, notas significativamente mais elevadas aos seus alunos do que seria expectável. O Sindicato dos Inspectores não tem dúvidas em relacionar estes dados com a falta de acompanhamento a este sector. “Se a inspecção lá fosse sistematicamente, teria um efeito preventivo. Mas a gente não vai lá”, sublinha José Calçada.

O MEC recusa, porém, esta acusação e fonte do gabinete de Nuno Crato garante que a investigação ordenada às escolas para avaliar o caso de inflação de notas vai, “pela primeira vez”, intervir sobre estabelecimentos do sector particular e cooperativo. “Note-se que este tipo de intervenção focada neste tema nunca tinha sido feita em escolas privadas”, é sublinhado pela tutela.

Os números oficiais não são totalmente claros. Segundo os Relatórios de Actividades da IGEC, entre 2009 e 2013, o número de acções realizadas nas escolas de todo o país caiu 41%, fixando-se nas 1295. No sector privado este valor é bastante superior; no mesmo período, o número de intervenções da inspecção junto dos colégios baixou de 360 para 135. Ou seja, em quatro anos, o acompanhamento ao sector particular e cooperativo diminuiu 68,5%.

O MEC defende, porém, que a estas 135 intervenções de controlo da organização e funcionamento dos estabelecimentos do ensino particular e cooperativo, é ainda preciso acrescentar as 41 visitas a jardins-de-infância geridos por IPSS e 60 acções junto de escolas privadas, no âmbito das provas e exames nacionais. A diferença explica-se, por um lado, por se tratarem de atividades diferentes ou por ter havido entretanto uma reorganização das escolas em agrupamentos verticais, que alterou a forma de organização da inspecção.

Tendo em consideração as contas da tutela, o número de intervenções em escolas não estatais é elevado a 236 – fazendo baixar a “quebra” da actividade juntos dos privados para 35%, abaixo da média geral. De acordo com o MEC, 2013 foi “o ano em que, percentualmente, se interveio mais no sector não estatal”, contabilizando 18% de todas as acções da IGEC, entre as quais está um “inquérito de grande complexidade a diversos colégios da rede GPS”, que foi remetido ao Ministério Público, sublinha a tutela.

O SIEE é também crítico do anúncio feito pelo MEC de que iria haver uma investigação aos casos de desvios nas notas dos alunos, depois das notícias dos últimos dias: “A Inspecção só lá vai, porque foi forçada a isso. Mas em termos práticos vai constar pouco mais do que aquilo que já se sabe”. Os dados têm apontado que a prática de inflação de notas tem sido recorrente ao longo de anos, por isso, lembra José Calçada, há hoje muitas pessoas licenciadas, com mestrados e doutoramentos, que beneficiaram deste sistema. “A maior parte dessas coisas, mesmo que fossem infracções de natureza disciplinar, e certamente que o seriam, já passou. E o volume de anos e de pessoas implicadas tornam inoperacional qualquer tentativa de remedeio”, avalia.

Nos últimos anos, a IGEC está, genericamente, a dar menos resposta à missão de acompanhamento e fiscalização do sistema educativo do que fazia em 2009, mesmo que tenha ganho competências também na área do Ensino Superior e da Ciência, fruto da reorganização dos serviços da Educação. Nos últimos quatro anos, o orçamento disponível teve uma redução de 8%, fixando-se nos 13,3 milhões de euros em 2013. Mas, no mesmo período, o número de inspectores caiu para menos de metade: De cerca de 400, passaram a ser 186 a 31 de Dezembro de 2013, segundo o relatório de actividades daquela entidade.

De resto, a própria direcção da IGEC vinha alertando, nos seus relatório, pelo menos desde 2009, para “esforço acrescido” que estava a ser pedido aos seus profissionais para “suprir os constrangimentos causados pela continuada tendência de saída de efectivos sobretudo por efeito das aposentações”. “Tem sido brutal”, descreve José Calçada, acrescentando a este um outro problema, o envelhecimento dos inspectores, que neste momento têm uma média etária à volta dos 55 anos. Por isso, o sindicato defende que haja um de reforço de meios da IGEC, a exemplo do que foi anunciado pelo Governo para o fisco, com a entrada de mil novos inspectores tributários: “Só assim podemos ter uma política de proximidade com as escolas, que permita resolver os problemas antes deles se tornarem graves”.


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