no público...
"Cada vez que saía um aluno da Escola Pedro Nunes, em Lisboa, o comentário era o mesmo: “Não saiu nada d’Os Lusíadas nem do Auto da Barca do Inferno!”
O exame nacional de Português do 9.º ano surpreendeu os alunos pela
“facilidade” e pelos textos escolhidos. Na prova, saiu um excerto de uma
entrevista ao escritor Mário de Carvalho e um outro texto retirado do
livro Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis.
A maioria desconhecia os escritores Machado de Assis
e Mário de Carvalho e alguns até misturavam o nome deste autor com o do
jornalista Carlos Vaz Marques que assina a entrevista. Muitos nunca
tinham ouvido falar de Carlos Vaz Marques, de Mário de Carvalho ou de
Machado de Assis, mas respiraram de alívio por não ter saído Camões nem
Gil Vicente. “Foi facílimo”, diz Francisco, de 15 anos, que não precisou
da meia hora de tolerância e saiu da sala às 11h.
Se antes de entrarem para o exame,
por volta das 9h, muitos estavam nervosos, no fim da prova, à porta da
Escola Secundária com 3.º ciclo do ensino básico de Pedro Nunes, já não
havia qualquer ansiedade. “Não saiu nada d’Os Lusíadas nem do Gil Vicente como estava à espera. Não estudei nada de especial, mas tinha receio d’Os Lusíadas”, admite Francisco, aluno de três, numa escala de notas que vai até cinco.
Ao
lado, José, 14 anos, concorda que o exame foi “muito fácil”: “Correu
bem. Tenho três de nota final de período, mas acho que no exame vou ter
quatro. Estudei mais ou menos, neste fim-de-semana por exemplo não
estudei, estava de férias na Comporta”, admite.
Se, antes de
entrar para a prova, Madalena, aluna de 16 anos que já reprovou uma vez,
estava nervosa e a acreditar que o exame iria ser “difícil”, no final
estava surpreendida e aliviada: “Foi tão fácil! Nada de Lusíadas, nada de Gil Vicente. A gramática também foi fácil”, diz a adolescente.
Na prova, saiu uma entrevista de Carlos Vaz Marques ao escritor Mário de Carvalho e ainda um excerto de Memórias Póstumas de Brás Cubas,
de Machado de Assis. Madalena só tinha ouvido falar vagamente de Mário
de Carvalho, através de um professor de História, mas naquele momento o
que mais lhe importava era achar que tinha respondido de forma acertada
às perguntas colocadas: “O primeiro texto [entrevista de Carlos Vaz
Marques a Mário de Carvalho] era facílimo e, nessa parte, de escolha
múltipla, acho que acertei tudo. O segundo texto [excerto de Memórias Póstumas de Brás Cubas],
de interpretação, já tinha de se pensar mais, demorei algum tempo, mas
também se fazia”, acrescenta. Só a composição, em que era pedido
que escrevessem sobre a função que o humor deve ter na sociedade, é que a
jovem achou “mais difícil”, pelo limite de palavras imposto – mínimo de
180 e máximo de 240. Apesar de ser aluna de três, Madalena não afasta a
hipótese de ter nota máxima na prova. “Espero ter um quatro, mas se
tiver um cinco…”, diz, entre risos.
Os nomes que estavam no
enunciado eram estranhos para a maioria. Muitos dos alunos nunca tinham
ouvido falar dos escritores Machado de Assis e Mário de Carvalho - nem
do jornalista Carlos Vaz Marques, que assina a entrevista -, alguns até
trocavam os nomes e diziam que tinha saído Mário Vaz de Carvalho. “Não
sou muito de ler, não gosto”, justifica Tomás, de 16 anos, que também
achou o exame “fácil”. Na composição, relacionou humor e política.
“Falei daqueles programas a gozar com os políticos”, explica o aluno,
que já reprovou uma vez.
João, também de 16 anos, entra na
conversa e diz que, na composição, defendeu a ideia de que o humor “não é
bem aceite na sociedade”. “Quando fazemos piadas sobre os outros, os
outros não gostam e nós também não gostamos que façam piadas sobre nós”,
precisa. Nesta parte do exame, o desafio era que a partir da frase “O
humor pode ser usado não só para criar momentos de divertimento, como
também para criticar o que se considera errado na sociedade” escrevessem
um texto no qual expressassem uma opinião sobre o papel que o humor
deve ter na sociedade.
Mariana, 15 anos, saiu radiante da prova,
mas também zangada porque os professores a puseram demasiado nervosa com
o exame, quando ele foi “tão fácil”. “Os professores assustam-nos,
dizem que é sempre difícil, que se não estudarmos não passamos… Nós
fartámo-nos de estudar e, depois, mais de metade da matéria não sai”,
desabafa a adolescente, que não teve explicações para se preparar.
Estudou sozinha e, nos últimos três dias, quatro horas diárias. “Fazia
apontamentos, lia os do professor", diz, sem dúvidas de que vai passar e
manter o três que tem."
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