sexta-feira, 5 de junho de 2015

a actualidade do dia-a-dia, numa visão pessoal do jornalista...!

Bom dia, já leu o Expresso Curto Bom dia, este é o seu Expresso Curto
Mafalda Anjos
Por Mafalda Anjos
Editora da E
 
5 de Junho de 2015
 


Bruno, o último dos moicanos. Vieira, o último dos maoistas 

Posso não ser uma enciclopédia do futebol, mas de direito ainda me lembro o que aprendi nos bancos da Faculdade. Justa causa de despedimento: comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torna imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho. Não conhecemos todos os contornos do caso, é certo, mas vai ser muito difícil justificar num processo disciplinar como possa Marco Silva ter preenchido estes requisitos ao violar o "dress code" verde, sobretudo depois de terminar a época em ombros ganhando uma taça que o Sporting não erguia há sete anos. A notícia de que Bruno de Carvalho pretende demitir o treinador por justa causa indignou mesmo alguns dos sportinguistas mais fervorosos. Bruno, o líder aguerrido, combatente e arrojado que foi roubar (ou será melhor dizer resgatar?) ao inimigo o treinador numa jogada de altíssimo risco lembra o último dos moicanos num faroeste distante sem lei. Muito cuidado Jesus. Nas costas dos outros vejo eu as minhas, já diz o povo.

Uma coisa é certa. Jesus todo-poderoso é mesmo omnipresente. Nas manchetes, nas aberturas dos telejornais, nas redes sociais... caramba ele está em toda a parte! Confesso, eu bem tentei, mas não há como fugir ao tema escaldante do momento. Entre os que lhe lançam pragas e os que lhe atiram juras de amor eterno, há de tudo. No Expresso Diário contámos os pormenores sobre os bastidores desta transferência. “Esta é uma história de um agente que quer ser um super-agente, de um presidente que quer ser um super-presidente e de um treinador que se acha um super-treinador. Mas não é uma história com super-ação, nem sequer com superação – é negócio, mais ou menos puro e sobretudo duro”, resume o arranque do texto. O resto vai ter de ler aqui e garantimos que vale a pena.

O que me preocupa mesmo são os milhões, porque se bem me lembro ainda vivemos num país acabado de sair da bancarrota. E eles são tantos, Jesus! Seis milhões não caem do céu, e não há relatos de minas em Alvalade nem de galinhas dos ovos de ouro para aquelas bandas da segunda circular. Sporting desmentiu ontem à noite em comunicado que a Guiné Equatorial e Álvaro Sobrinho tenham entrado com o dinheiro. De onde virá então a massa e como é a questão que todos discutem. João Quadros, mordaz como sempre, avança com uma hipótese: e se fosse o Ricardo Araújo Pereira a pagar o primeiro mês?

Brincadeiras à parte, que o assunto não parece sério mas é, Ricardo Costa, sportinguista confesso, é certeiro: este é um clube herdeiro dos destroços do Sporting dos Betos. “Durante anos e anos, foi dirigido por ondas sucessivas de meninos bem, formados nas melhores escolas e com belos apelidos, mas incapazes de gerir um snack bar”, escreveu na sua crónica. É justo agora perguntar: Será que Bruno de Carvalho é capaz de gerir valores de uma multinacional?

Nesta novela tão quente, achei curioso descobrir que Luis Filipe Vieira é capaz de ser um dos últimos maoistas lusos. "Sou o timoneiro desta grande barca", disse ontem à noite comentando a saída do treinador encarnado. E, tal como Mao Tsé-Tung, que também se intitulava o Grande Timoneiro, mostrou-se adepto das operações de limpeza. Se não gostas do curso da história, apaga-a. A indignação foi tanta pelo Estádio da Luz que Jesus foi retirado do presépio, ou melhor dizendo, da estrutura de bicampeões na Loja do Benfica. E conseguiu fazer todo um discurso sem citar o nome de Jesus uma única vez. Esta é sem dúvida uma das histórias mais divertidas do dia. Já tentei gritar, como a minha homónima da BD, "pare o mundo, quero descer!", mas infelizmente não resultou, por isso o melhor é mesmo rir para não chorar. 

Dito tudo isto, só me assalta uma última e velha questão: mas porque raio é que perdemos a cabeça com a bola? Dizem os psiquiatras e estudiosos que o futebol cumpre uma função quase higiénica de limpeza da alma, de catarse coletiva, de extravasamento de emoções recalcadas na sociedade, num território onde a emoção cede lugar à razão mesmo no mais inteligente dos seres humanos. Para uma viagem à psique da “futebolite” aguda, vale a pena reler este texto publicado na Revista do Expresso por altura do último Mundial (digo com pouca modéstia, porque fui eu que o escrevi). 


Outras notícias
Sim, acredite-se ou não, há vida para além da bola. Na TAP, o relógio está em contagem decrescente até às 17h, quando termina o prazo para a apresentação das propostas de privatização. O governo alegou interesse público para continuar o processo, pelo menos até que o Supremo Tribunal Administrativo tome uma decisão sobre a providência cautelar. Escreve o Público em manchete que o executivo defende a venda da empresa com risco de quebra da confiança dos investidores.

Destruição de confiança houve, como todos sabemos, no BPN. Diz hoje o Diário de Notícias na primeira página que o Estado acusou de gestão danosa os administradores que nomeou. A queixa-crime da Parvalorem denuncia gestão danosa e abuso de confiança de poder dos administradores nomeados pela Caixa Geral de Depósitos. Em causa estão créditos com garantia estatal e renegociação da dívida.

Apesar de parecer que chovem milhões e que somos todos ricos, o facto é que Portugal continua exatamente onde estava anteontem antes de Jesus ter descido ao planeta verde – com o desemprego em valores preocupantes, a emigração ao nível dos anos 60 e a pobreza a chegar quase aos 20%, no patamar em que estava no início do século. Bolsos vazios ou cofres cheios, depende da perspetivas, mas vale a pena ler esta excelente análise sobre a evolução dos principais indicadores económicos e sociais de Portugal desde 2011 com tudo o que mudou nestes quatro anos.

Lá fora, o tema escaldante não é a bola, mas a Grécia, uma bomba-relógio que parece não ter forma de ser desativada. Os jornais lá fora dão como certo o aproximar de uma saída da zona euro, depois de o país ter adiado o pagamento dos 300 milhões de euros ao FMI calendarizado para hoje. Tsipras tentou acalmar os ânimos, pedindo calma e tentando empurrar o primeiro pagamento para o final do mês. Entretanto, Varoufakis pediu esperança para o seu país, num artigo que publicou ontem. O ministro grego das Finanças recordou o famoso "discurso de esperança" de James Byrnes, secretário de Estado norte-americano, que deu à Alemanha "a oportunidade de acreditar na recuperação, crescimento e regresso à normalidade". Para ver o artigo original, espreite aqui.

Assustador foi também o ataque cibernético de larga escala que os Estados Unidos sofreram ontem à noite, alegadamente por parte de hackers chineses, que tiveram acesso a dados pessoais de cerca de quatro milhões de trabalhadores de agências governamentais norte-americanas. Tudo isto debaixo das barbas da super-poderosa (e muito perigosa, acrescento eu) NSA. O New York Times está, claro, em cima do assunto.

Uma nota para recordar que daqui a dois dias arranca a cimeira do G7 e os protestos já começaram. A polícia alemã montou uma gigantesca operação de segurança, claro está, para zelar pela segurança dos chefes de estado dos países mais poderosos do mundo. A situação na Ucrânia será o principal dossiê em cima da mesa, mas a Rússia já avisou que não estará presente no encontro.

Para algo completamente diferente, há uma vagina a causar polémica em Versalhes. Sim leu bem, vagina, mas não é dessas que estará porventura a pensar. Refiro-me a uma obra de arte de Anish Kapoor instalada nos jardins do palácio que motivou protestos de grupos conservadores ainda antes da exposição abrir as portas no dia 9. Kappor descreve a sua obra “Canto Sujo”, uma espécie de grande túnel de metal, como a “vagina da rainha”. Não há mesmo como ficar indiferente… 

E, para terminar este bloco, sabia que a bondade é contagiosa? Alguns estão é muito bem vacinados contra ela, brinca o neurocirurgião Lobo Antunes. Apesar de tudo, ainda há esperança para a Humanidade.


Frases
“Estou grato a Jesus! Para o ano vamos ter treinador comprometido com o Benfica e não apenas com o seu ego e conta bancária”, atira João Gabriel, diretor de comunicação do Benfica, no Twitter

"Para mim, o presidente do Sporting ia para o manicómio. Absolutamente inacreditável. [Uma] loucura", comentou na Antena 1 Dias de Cunha, antigo dirigente leonino

“Não tenho vínculo com o Podemos nem com nenhum Partido. Sinto-me livre”, afirmou Manuela Carmena, a provável futura alcaide da capital espanhola, líder da plataforma “Ahora Madrid” que teve o apoio de vários partidos independentes de esquerda como o podemos e o Equo

“As pessoas que dizem que os outros são difíceis são geralmente difíceis eles próprios”, disse o cantor Van Morisson ao Guardian


O que ando a ler
“A decisão de carreira mais importante na vida de uma mulher é se vai ter um parceiro para a vida, e quem é esse parceiro.” Nunca mais me saiu da cabeça a frase de Sheryl Sandberg que li há cerca de dois anos no seu bestseller “Lean In” (Faça Acontecer, na edição portuguesa) – uma leitura obrigatória para perceber o feminismo do século XXI de que ela é uma das principais porta-vozes. Lembro-me agora dela e deste livro porque a gestora, número dois do Facebook e uma das mulheres de negócios mais bem-sucedidas do mundo, escreveu ontem um comovente texto sobre a morte do seu marido há um mês – o parceiro sem o qual, palavras da própria, ela nunca tinha chegado onde chegou. Pela primeira vez, veio falar do acidente que ocorreu durante as férias do casal no Novo México, quando Dave Goldberg (também ele executivo de sucesso em Sillicon Valley) caiu inanimado enquanto corria numa passadeira de um ginásio e bateu fatalmente com a cabeça.

Neste post no Facebook que marcou o fim do seu sheloshim (o período de pesar intenso para uma esposa judia), Sheryl dá um testemunho honesto e comovente sobre o processo de luto, dor e superação que está a viver desde a tragédia. Conta por exemplo como lida com as perguntas do género “Como estás?”, e como seria melhor se lhe perguntassem “Como estás hoje?”. Como teve de escolher entre ceder ao vazio ou encontrar um significado. 30 dias depois, diz que está 30 anos mais triste, mas 30 anos mais sábia. E como aprendeu a pedir ajuda, ela que é a COO, a líder, a irmã mais velha, a fazedora, a planificadora, e que teve à força de aprender a delegar nos outros a liderança, a planificação e a ação, explicando que a resiliência pode, afinal, ser aprendida. Um texto tocante que é quase uma lição de vida.

Por estes dias gostei também de ler esta peça do Washington Post sobre aqueles que usam a rede social para se informar. O título é longo, mas elucidativo: “Se usa o Facebook para receber as suas notícias – por favor, pelo amor à democracia – leia isto primeiro”. Veio este texto a propósito de um estudo da Pew Research divulgado esta semana e que me tinha impressionado: 61% dos Millennials (a geração genericamente apontada entre os 35 e os 15 anos) norte-americanos dizem que se informam sobre política e governo no Facebook. Sublinha o jornal que a rede social não é uma fonte de informação credível porque não é… uma fonte de informação. Tudo o que se vê nas timelines é filtrado por um poderoso algoritmo que combina inúmeras variáveis, e o que cada um vê é a ponta do iceberg de uma realidade bem maior, mais vasta e mais complexa. Sublinha e bem o jornal, que formar opinião política por este meio põe assustadoramente em risco a democracia. Para perceber tim-tim por tim-tim como funciona o algoritmo do Facebook chamado EdgeRank que determina o que aparece na sua cronologia, veja este texto do Expresso escrito durante uma visita à sede da maior rede social do mundo.

É por estas e por outras que o Expresso está sempre aqui para si, com toda a informação relevante atualizada e criteriosamente editada, e chega amanhã às bancas como sempre em versão semanal. Em destaque na revista E tem para ler o tema de capa escrito por João Garcia, um verdadeiro manual de instruções de como chegar a Presidente da República, num mergulho aos bastidores das campanhas eleitorais de Mário Soares, Jorge Sampaio e Cavaco Silva. Segunda-feira voltamos com mais um Expresso Curto e certamente escaldante, ou não fosse tirado pelo grande timoneiro cá do sítio, o diretor Ricardo Costa.

Bom fim de semana e boas leituras. Ah, e não se enerve com o futebol porque diz que isso faz mal à saúde!  

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