sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

coisas da educação... reflexões para o fim de dia...!

Educação Física… Your’re Out!

by Alexandre Henriques

Desde que Paulo Guinote aceitou o meu convite para fazer comentários às sondagens do ComRegras deixei de opinar sobre as ditas não só por respeito, mas também por reconhecer a excelência da sua análise. Porém, excecionalmente, por ser uma matéria tão presente no meu dia-a-dia, não posso deixar de opinar sobre os resultados da última sondagem - A disciplina de Educação Física deve contar para a média de acesso ao ensino superior?. Declaração de interesses, sou professor de Educação Física.

Média 
Setembro de 2005, reunião geral de professores, a diretora durante o seu discurso profere a seguinte afirmação "...só os professores de educação física é que não serão diretores de turma pois não têm perfil para isso...", resposta de um colega de português "pois... é a malta das cambalhotas..."
Na altura fiquei entre o estupefacto e a vontade de perguntar de onde é que me conheciam para fazer esse juízo de valor? Foi o momento de maior preconceito a que assisti em toda a minha carreira docente, esse e o de ter de subir a nota para um aluno passar só porque tinha negativa à minha disciplina. Desde então, na mesma escola, fiz de tudo um pouco e já fui DT por mais do que uma vez... e que eu saiba continuo a ser professor de educação física...
Voltando à sondagem que mostra que mais de 70% dos votantes são favoráveis à (re)integração da disciplina de educação física na média de acesso ao ensino superior, deixa-me naturalmente satisfeito, pois verifico que a maioria pensa como eu.
Não vou cair na tentação de começar a medir a importância das disciplinas, pois se a conversa for por aí, cada um vestirá a sua camisola e estaremos perante um debate ao estilo "prolongamento" da TVI24 e esta coisa da minha ser melhor que a tua, não é lá muito digna para um espaço que é escrito por e para professores.
A razão pela qual a disciplina de educação física foi banida das contas da média de acesso é um mistério. Na altura, a justificação de Nuno Crato foi algo semelhante ao facto do iogurte não ter espinhas ou a trovoada que acontece num dia de céu limpo... Algo do género...
Concordo com Paulo Guinote quando diz que a média do 12º ano para efeitos de acesso ao Ensino Superior deve ser construída a partir de disciplinas relevantes para os cursos a que concorre o aluno. Este é um principio lógico e que qualquer pessoa entende a sua equidade. O que não faz sentido é a disciplina de educação física ter sido a única ostracizada para que um nicho de alunos não fosse prejudicado na sua média de acesso ao superior. E digo nicho, pois se forem constatar as pautas da vossa escola, irão verificar certamente que a disciplina que normalmente apresenta melhores resultados é a disciplina de educação física.
E de que nicho é que estamos a falar? Dos alunos que normalmente são excelentes a tudo, menos a educação física. Algo que também existe na versão light, mas esses que normalmente estão carregadinhos de negativas e só são bons a educação física, ninguém quer saber. São aqueles que vão baixar a média da escola, o que não dá muito jeito, pois num mundo onde a imagem é tudo, seja ela real ou artificial, a cosmética dos rankings conta muito, demasiado...
Mas até que ponto é que nos últimos 4 anos foi visível uma alteração às médias de acesso ao superior, em virtude do afastamento da disciplina de educação física? Evidentemente que não fiz nenhum estudo, mas se pegarmos no exemplo mais comum, como a média de acesso ao superior para medicina, podemos constatar que esta ficou dentro do padrão. E digam-me... ficou alguma vaga por ocupar? Claro que não! A diferença é que nestes 4 anos entraram para medicina excelentes estudantes e que provavelmente não têm muita apetência para a educação física. Nos anos anteriores entraram para medicina excelentes estudantes, mas que também eram excelentes/bons alunos a educação física. Se me perguntarem qual o médico que eu prefiro, digo o segundo. Porquê? Então porque razão havia de escolher o primeiro???
Um erro crasso que continua a acontecer a quem não percebe nada de educação física é que baseia a sua opinião numa visão redutora da disciplina do pontapé para a frente, cambalhotas e afins. E esta imagem, tem que se dizer a verdade, está associada a um tempo onde a disciplina era dada ao estilo ATL. Mas caros amigos, eu que até tirei o curso das saltos e saltitos e até percebo alguma coisa disto, sei que a coisa não é bem assim... Eu até percebo que as pessoas não entendam, o que eu não percebo é o preconceito que existe pelos pais mas também pelos professores, demasiados professores...
Reparem, não é por ser professor de educação física que vou reduzir a matemática ao nível das contas de supermercado, ou o português ao nível da leitura das placas do mesmo supermercado. Todas as disciplinas, todas, e repito novamente, todas, são importantes na formação, intelectual, social e física do aluno, estamos a falar numa formação transversal realizada por um conjunto de disciplinas que articulam entre si de modo a dotar o aluno dos conhecimentos necessários para ingressar no mercado de trabalho ou seguir para o ensino superior.
Mas não acreditam? Vejamos um caso concreto:
Um aluno está a jogar basquetebol, em campo estão 10 jogadores, existe uma bola, existem linhas que delimitam o campo, existem "n" regras que é preciso conhecer, existem "y" variáveis que é preciso ter em conta: a trajetória da bola, os movimentos dos seus colegas de equipa; os movimentos dos seus adversários; a coordenação óculo-manual para dominar aquela coisa redonda e que não para quieta; o sentido do jogo; as inúmeras nuances tácticas ofensivas e defensivas; etc... Depois de tudo isto dominado, o aluno tem de tomar decisões baseando as mesmas em variáveis que estão sistematicamente a mudar. E podia passar o dia todo a dar exemplos...educação física
Já viram bem quantas luzinhas acendem no cérebro do aluno numa fração de segundo? Não será isto relevante para a capacidade de raciocínio, memória, análise, interpretação, adaptação, aplicação e sei lá mais o quê das suas capacidades intelectuais? Não é a disciplina de educação física fértil na assimilação dos princípios de  trabalho em grupo, respeito pelo parceiro, resiliência às dificuldades e ao insucesso? Não são estes princípios transversais a tantas e tantas profissões incluindo a nossa? Então porque razão não deve contar para a média de acesso ao ensino superior?
O problema está na premissa... Se educação física fosse facultativa não abria mais a boca, não estaria no mesmo patamar, agora se é uma disciplina de formação geral, esta não pode ficar de fora, pois tem tanto direito como as outras e é tão útil como as outras... A descrédito da disciplina de educação física e restantes disciplinas de expressões baseia-se num puro preconceito, por resumirem estas disciplinas a algo inferior e que não é útil nas suas profissões futuras. Se eu começasse para aqui a dizer a quantidade de matéria que aprendi e que hoje não utilizo, nunca mais me calava...
Fiquem bem e mexam-se um bocadinho ;)
P.S- E já agora, apenas uma correção... Educação Física não é ginástica... é mesmo educação física, ginástica é uma modalidade... Era a mesma coisa que eu chama-se a disciplina da matemática a disciplina da trigonometria ou a português a disciplina dos Lusíadas.

leitura complementar, o comentário do paulo guinote:

declaração de interesses:
quando votei deixei um comentário no com regras, a saber -
luiz carvalho
se como muitos argumentam com o facto de a disciplina ser curricular para entrar na média então, pergunto eu, porque é que educação moral e religiosa não conta na média dos alunos que a têm como disciplina…?
declaração de interesses: devo dizer que votei não…
 

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