segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

a actualidade do dia-a-dia, numa visão pessoal do jornalista [2]...!

Bom dia, já leu o Expresso Curto Bom dia, este é o seu Expresso Curto

Ricardo Costa
Por Ricardo Costa
Diretor
 
1 de Fevereiro de 2016
 
Temos ou não orçamento? Mais 72 horas e sabemos
 
A semana que passou não fechou com muitas certezas sobre o Orçamento de Estado. E a que começa, bem, a que começa traz-nos apenas uma certeza. Daqui por 72 horas, mais coisa menos coisa, reúne o Conselho de Ministros para aprovar o documento final que terá que ser levado ao Parlamento no dia seguinte, quando o primeiro-ministro estará de visita a Angela Merkel.

Simples? Nem por isso, porque números são números e horas são horas. E por mais que se contem os primeiros e se estiquem as segundas, o governo português tem 72 horas para se por de acordo com a Comissão Europeia porque o texto a aprovar em Conselho de Ministros precisa do acordo tácito de Bruxelas.

Como tudo isto é um pouco confuso, vamos por pontos, que ajudam às conversas matinais em volta da máquina de café:
  • Até agora, todas as indicações públicas e até dos bastidores de Bruxelas são negativas
  • Ao mesmo tempo, decorrem conversas diplomáticas e técnicas de alto nível e ninguém sabe em rigor o que se está a passar nesses campos
  • O governo português garante que a situação está perfeitamente controlada e que o Orçamento vai cumprir todas as regras sem ter de deixar cair qualquer promessa eleitoral ou que decorra dos acordos assinados com os partidos à sua esquerda.
  • A missão da troika que veio a Lisboa está muito desagradada, mas em bom rigor já tem pouco a dizer sobre a matéria. Quem decide agora é a Comissão Europeia
  • Há, assim, um claro desfasamento entre as críticas técnicas – muito duras – e algum otimismo político, que parece estranho e ainda é pouco tangível neste contexto
  • Embora a negociação seja eminentemente técnica, há questões sobre a forma de contabilizar certas operações que só podem ser desbloqueadas politicamente. E parece ser aí que o executivo socialista está a apostar todas as fichas
  • Se a negociação correr bem, será uma grande jogada. Se correr mal, bem, deixemos os adjetivos prontos e as carteiras abertas porque, quando correm mal, estes braços de ferro orçamentais acabam sempre com aquilo que nós sabemos
Ontem, Marques Mendes, no habitual espaço de comentário na SIC já disse que “vamos ter provavelmente um aumento de impostos”. Na sua análise, o comentador arriscou que poderão estar a ser preparadas “medidas muito aborrecidas”, no âmbito das conversas com Bruxelas, por um lado, e os partidos à esquerda, por outro.

Enquanto isso, numa galáxia distante, Porfírio Silva, filósofo que integra a direção do PS, continua a combater a ideia de que o bom senso está bem distribuído pela humanidade, proferindo frases onde o bom senso não deixa rasto.

A frase mais recente, que faz manchete no jornal i é a seguinte: “Corremos o risco de a Europa se transformar numa URSS sem KGB”. Isso mesmo. Enfim, digamos que podíamos pensar em metáforas sobre o PS e o estilo de comunicação de alguns dirigentes, mas seria demasiado básico. Adiante que os relógios não param.
 

OUTRAS NOTÍCIAS
Sabe de cor o seu NIB ou anda com um papelinho na carteira? Pois bem, é melhor passar a saber o IBAN. Não é nada de mais, é só o prefixo PT50 antes daqueles 21 dígitos do NIB. Tudo porque a partir de hoje as transferências bancárias passam a ser feitas com o IBAN. No multibanco pode continuar a usar o NIB, mas no resto não.

Vale e Azevedo saiu em prisão precária três dias. A vida judicial do ex-presidente do Benfica é muito confusa: saiu por três dias enquanto cumpre uma pena da qual pode vir a ter direito a liberdade condicional daqui por uns meses. Mas ainda faltam mais uns processos, que só podem ser julgados daqui por uns anos. Tudo porque a atual pena está condicionada por um processo de extradição do Reino Unido que impede qualquer outro julgamento até este caso estar terminado. Com Vale e Azevedo nada é simples.

O DN afirma em manchete que os médicos reformados podem acumular pensão e salário se voltarem a exercer. Para compensar a falta de médicos no SNS, esta solução deve mesmo avançar, sobretudo depois de no ano passado mais 900 médicos se terem reformado ou emigrado.

Nove das 25 mulheres mortas pelos maridos em 2015 já tinham feito queixa à polícia. São dados da APAV divulgados pelos Público.

A Europol deixou ontem um alerta assustador: 10 mil crianças refugiadas terão desaparecido dos radares oficiais nos últimos dois anos e podem estar a ser exploradas por redes mafiosas, como aconteceu no pós-guerra dos Balcãs.

Em simultâneo, a tensão política sobre a forma de lidar com a vaga de refugiados é enorme, da Alemanha à Suécia, passando pelos locais de chegada à Europa, sobretudo Grécia e Itália. Não parece haver grande coordenação ou acordo político e o fluxo não parou com o inverno, colocando questões muito complexas do ponto de vista humanitário, económico, político e até de segurança.

Hoje arranca uma reunião de emergência da OMS para decidir se se a ameaça trazida pelo vírus Zika deve ou não ser considerada como uma crise global de saúde. As últimas informações são alarmantes, com uma crise que pode marcar toda uma geração.

Hoje é dado o tiro de partida para as eleições presidenciais dos EUA, num estado que tem menos de 1% da população americana (Iowa), mas que dita cartas no sucesso e insucesso de democratas e republicanos. Hillary Clinton e Donald Trump vão destacados em cada um dos partidos, mas hoje quer Bernie Sanders quer Ted Cruz querem mostrar que estão em força na longuíssima corrida.

A queda do preço do petróleo continua a provocar problemas orçamentais em países habituados a nada em divisas. Agora é a vez da Nigéria, maior produtor de África, pedir ao Banco Mundial e ao Banco de Desenvolvimento Africano 3,5 mil milhões de dólares em linhas de emergência, para tentar endireitar um Orçamento falhado.

Ao mesmo tempo, as ações terroristas no país prosseguem a um ritmo impressionante. Ontem, o Boko Haram arrasou e incendiou uma aldeia, matando e queimando pelo menos 80 pessoas, incluindo crianças.

Em Damasco, capital síria, três explosões mataram 50 pessoas num subúrbio onde está situado o principal santuário xiita do país e que serve de base às milícias que apoiam o regime de Bashar al-Assad. Os atentados foram reivindicados pelo Daesh.

A tragédia ocorreu enquanto prosseguem as conversações de paz para a Síria, com mediação da ONU, num modelo em que poucos acreditam, dada a geografia muito variável do conflito e a ausência de algumas partes fundamentais na guerra civil e com controlo territorial evidente.

Em Espanha, a confusão política faz Portugal parecer um relógio suíço. Pedro Sanchéz, líder do PSOE, está preparado para ser indigitado e tentar formar governo, apesar das difíceis opções de coligação e da oposição de boa parte do seu partido. O El País explica tudo aqui: Sánchez tiene ya un primer borrador de 50 hojas de su oferta de pacto.

Do lado do Partido Popular, só se espera que o Rei Felipe VI dispense Mariano Rajoy – que venceu as legislativas mas não consegue formar governo – da indigitação formal, para evitar perder tempo e pressionar Sanchéz.

Noutras paragens, a Google apresenta hoje os primeiros resultados depois da transformação em Alphabet. Os analistas vão estar de olho neste gigante das tecnologias e na forma como separou a sua operação tradicional (Google) de todas as áreas experimentais, debaixo do guarda-chuva Alphabet.

O nosso futebol anda na mesma, discute-se muito a arbitragem e os três grandes lá vão andando. Sporting, Benfica e Porto seguem na frente, separados pelos mesmos pontos, mas com mais uns quantos casos para discutir de manhã à noite.

Nada como espreitar os jornais desportivos e citar as respetivas manchetes, hoje todas dedicadas ao Benfica e assente em ideias e imagens curiosas: “Jonas, o senhor dos Golos” (A Bola); “Jonas, Pistolas” (Record); “Grupo de Baile” (O Jogo). Ok…

Terminou o Open da Austrália em ténis, com o sérvio Novak Djokovic a voltar a vencer o escocês Andy Murray por 6-1, 7-5 e 7-6. Foi a sexta vitória de Djokovic na Austrália. Impressionante.

 
FRASES
“Julgo que chegaremos ao Conselho de Ministros, na quinta-feira, com tudo resolvido com a Comissão Europeia”. António Costa, primeiro-ministro, em i declarações ao Público

“O Bloco de Esquerda leva a sério os seus compromissos e não volta atrás com a sua palavra”. Catarina Martins, líder do BE, sobre o Orçamento

“Compensação será corte na despesa e provavelmente um aumento de impostos”. Luís Marques Mendes, no habitual espaço de comentário na SIC

Podia colocar aqui mais duas dúzias de frases sobre o OE, mas ficavam muitas de fora e a confusão só aumentava. Fiquemos por aqui e vamos a outras leituras.

 
O QUE EU ANDO A LER
Acabei de ler ontem, Flores de Afonso Cruz. Foi o primeiro livro que li de um dos mais falados jovens escritores portugueses. Falados, premiados e publicados, porque Afonso Cruz escreve muito – além de ilustrar e de ser músico – e tem tido muito sucesso com um universo muito particular de livros e personagens, sendo que algumas circulam por mais do que uma obra.

É o caso deste Flores, o seu primeiro livro com um título que se resume numa palavra. Todos os outros livros tinham títulos grandes que enchiam o ouvido e a vista (Para onde vão os guarda-chuvas, Jesus Cristo bebia cerveja, Os livros que devoraram o meu pai, etc) e este é só mesmo isto, Flores. Ponto.

As personagens que reaparecem neste livro não são centrais à história, mas simbólicas num livro que percorre a importância da memória e da sua perda. Onde uma personagem tenta ajudar outra a fazer o caminho das pedras em marcha atrás, cruzando vidas cheias de altos e baixos e tentando preencher os espaços que ficaram literalmente em branco.

O que fazem aqui as flores, no título e na história? A resposta estragaria tudo e o livro não merece isso. Mas são uma das chaves fundamentais na busca pela memória perdida, empurrada por um verso de São João da Cruz: “Entremos mais dentro na espessura”.

Num artigo do Expresso sobre este livro, Afonso Cruz dizia que esse verso de São João da Cruz era “fortíssimo, daqueles que podia tatuar num braço.”

Este verso parece ter pouco a ver com a segunda sugestão que vos deixo, neste caso de um fabuloso documentário já disponível para quem tem Netflix: What Happened, Miss Simone?, de Liz Garbus. Mas quem vir este trabalho sobre a genial Nina Simone perceberá que o verso também aqui podia estar.

What Happened, Miss Simone? está justamente nomeado para um Óscar. Se espreitar o trailer percebe porquê. A vida daquela que quase foi a primeira pianista clássica negra dos EUA – foi impedida de entrar na melhor escola de música clássica por razões raciais – e que acabou por ser uma das mais radicais ativistas dos direitos civis nos anos 60 e 70 é tudo menos um conto de fadas, mas é sempre, mesmo sempre, musicalmente superior e inimitável. Uma mulher extraordinária em todos os sentidos do termo.

Se se puser a ouvir Nina Simone nem dá pelas tais 72 horas que hão de nos levar até ao Orçamento. Se a sua vida não der para isso, então o melhor é ir espreitando o Expresso Online. Vamos atualizando tudo o que houver nestes e noutros assuntos. Mais ao fim do dia, arrumamos tudo no Expresso Diário, com novas notícias, boas histórias e opinião em primeira mão. Como o mundo não pára e nós também não, o Expresso Curto regressa já amanhã bem cedo.

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